São Paulo, segunda-feira, 13 de janeiro de 1997
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Momento de pedir verba é todos os dias, diz relator

RUI NOGUEIRA
SECRETÁRIO DE REDAÇÃO DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

RAYMUNDO COSTA
O deputado Vic Pires (PFL-PA), relator da emenda da reeleição que será votada amanhã pela comissão especial da Câmara dos Deputados, é pefelista típico -um "maluco por privatização" e um ser em evolução nas questões sociais.
Fã da apresentadora Angélica, Pires mistura a posição favorável à descriminalização do aborto e ao projeto da união civil gay, à defesa da pena de morte e da não-legalização do uso de drogas.
Ele diz que a reeleição foi "fulanizada" em FHC, mas a emenda deve ser aprovada na comissão especial por 19 votos a 11.
Pires abomina a idéia de um plebiscito ou referendo. "Plebiscito é para ser usado nas coisas do drama da consciência", diz.
Defensor do direito de o presidente candidatar-se a um segundo mandato sem deixar o cargo, o relator considera o uso da máquina administrativa na eleição "uma realidade".
Tirado do anonimato pela relatoria da emenda da reeleição, o deputado paraense já definiu seu próximo salto político: a disputa pela Prefeitura de Belém.
A seguir, os principais trechos da entrevista concedida por telefone na sexta-feira à tarde. O relator estava em Belém, na TV Liberal, onde foi apresentador de telejornal por 17 anos.
*
Folha - O que é mais difícil, ser apresentador de telejornal ou relator da emenda da reeleição?
Vic Pires Franco Neto - Ser relator é uma coisa mais complicada. A relatoria põe os holofotes todos em cima do parlamentar. Apresentar telejornal era uma rotina.
Folha - Do ponto de vista político, como é que o sr. torna a reeleição defensável?
Pires - O principal argumento é que a reeleição é um direito de o eleitor escolher quem quiser. Hoje há uma restrição na Constituição, essa restrição vai acabar e vai haver um direito novo para o eleitorado.
As pessoas "fulanizaram" tanto a reeleição que todo mundo mirou em uma coisa só, no Fernando Henrique Cardoso.
Folha - Os opositores da reeleição falam em mudança das regras no meio do jogo.
Pires - Não está se mudando a regra no meio do jogo. A emenda do deputado Mendonça Filho (PFL-PE) foi apresentada em 1º de janeiro de 95. Estamos a quase dois anos da eleição para a Presidência da República. O jogo vai ser daqui a dois anos.
Nós tínhamos duas opções: um mandato de seis anos ou um mandato de quatro com direito à reeleição. O de seis anos é perigoso. Está aí o exemplo do Collor. Se você tem um mau presidente tem que aturá-lo por seis anos. Com quatro anos, você sabe que, por meio do voto, vai mandá-lo para casa. Se fez um bom trabalho, vota nele outra vez.
Folha - Como é que a relatoria da emenda da reeleição foi cair no seu colo, um ilustre desconhecido?
Pires - Foi um acaso. Acho que por eu ser tão desconhecido na época nem me convidaram para assinar a emenda.
Se tivesse assinado, não poderia ser relator. Mas eu teria assinado, porque sempre fui a favor da reeleição.
A reeleição é o aperfeiçoamento da democracia.
Folha - Qual é o seu prognóstico para a votação da emenda na comissão especial?
Pires - Deve ser 19 votos a 11. No plenário da Câmara, espero que passe por um placar entre 320 e 330 votos. Rezo por isso.
Folha - Qual a sua opinião sobre reeleição antecedida por plebiscito ou seguida de referendo?
Pires - Sou totalmente contra o plebiscito e o referendo. O plebiscito quebra a representatividade da democracia. Tem que ser usado para coisas do drama da consciência, dramas da pessoa -aborto, pena de morte etc. O congressista, nesses casos, não tem o direito de entrar na vida pessoal para decidir sozinho.
O referendo, nesse caso, é pior ainda. Estamos ali (no Congresso) em nome do povo, e, depois, vamos colocar isso em votação para que o povo possa dizer se erramos ou acertamos?
Folha - O sr. vê alguma legitimidade na barganha do voto, em deputado pedir verbas e obras para seus Estados aproveitando a tramitação da emenda da reeleição?
Pires - Não acho que haja momento para pedir verba. O momento de pedir verba é todo dia. Temos de perturbar os ministros e levar verba para os nossos Estados. Essa é a nossa obrigação. Se os deputados estão fazendo isso, parabéns, nota dez. A reeleição está aí, amanhã não está mais, e o deputado vai continuar pedindo verba.
Folha - Alguns deputados estão mudando o voto em relação à reeleição. Não está clara a prática do "é dando que se recebe"?
Pires - Não vejo dessa forma. As coisas estão se ajeitando. É um direito do presidente Fernando Henrique querer ser governo. Como é um direito da oposição fazer com que esse direito não passe.
Folha - A reeleição para prefeito não pode ajudar a perpetuar oligarquias regionais?
Pires - Temos é de fazer com que a Justiça Eleitoral funcione cada vez mais. O uso da máquina é realidade na eleição. Nós temos é de criar instrumentos para a Justiça Eleitoral ser mais severa.
Folha - Como o sr. recebe o argumento de que a reeleição não faz parte da tradição republicana?
Pires - O regime militar também pode ser considerado uma tradição republicana. A Inquisição foi uma tradição da Igreja Católica e foi quebrada.
Folha - De onde é que o sr. tirou a idéia de mudar a data da posse do presidente?
Pires - Havia duas propostas de emenda constitucional sobre o assunto. Uma propunha a posse para 3 de janeiro e outra para 3 de fevereiro. Achei que a melhor data seria 10 de janeiro. Só gosta da posse de um presidente no dia 1º de janeiro quem não tem família.
Folha - Alguns projetos em tramitação no Congresso tratam do que o sr. chamou de "dramas de consciência". Como, então, o sr. se posiciona sobre o aborto?
Pires - Aborto é uma decisão pessoal. O plebiscito sobre aborto deveria ser feito só para as mulheres. O homem não tem nada a ver com isso. É algo tão pessoal que ninguém têm de opinar. Em uma situação prática, a mulher tem que decidir. Nós temos é que descriminalizar o aborto.
Folha - E a pena de morte?
Pires - Sou favorável nos crimes hediondos, como sequestro com morte, sequestro de crianças, estupro. Iria coibir bastante a criminalidade.
Folha - Drogas e, especificamente, a legalização da maconha?
Pires - Sou totalmente contra a legalização da maconha. Tenho pavor de drogas, nunca usei.
Folha - União civil gay?
Pires - Voto a favor. As pessoas têm todo o direito de escolher o que querem. Esse projeto foi vulgarizado com o nome de "casamento gay" e não é nada disso. Se duas pessoas do mesmo sexo constroem uma vida em dez ou 15 anos, constroem um patrimônio. Um morre e o outro não vai ter nada?
Folha - E a privatização da Vale do Rio Doce?
Pires - Sou totalmente a favor. Deveria ter sido privatizada há muito tempo. O governo não tem de ter empresas. Sou maluco por privatização. O governo tem de cuidar do social e da infra-estrutura. O que tem é de ter um governo forte que cobre da iniciativa privada um bom tratamento em relação às coisas públicas.
Folha - A maioria da bancada do seu Estado (Pará) é favorável à não-privatização. A Vale do Rio Doce é muito forte no Pará.
Pires - É muito forte, mas não faz nada pelo Pará. Onde é que a Vale tem deixado riqueza aqui? Fala-se muito em ser uma empresa grande, maravilhosa, que dá lucro. Não dá lucro nada. Tem é que vender, pegar o dinheiro e investir nos Estados, no social, no pobre.
Folha - Banco do Brasil?
Pires - Sou favorável à sua privatização. O governo tem de ter apenas o Banco Central.
Folha - Qual a sua opinião sobre reforma administrativa e demissão de funcionários públicos?
Pires - Está na cara que o Brasil tem muito funcionário público, muito mais do que precisa. Vemos isso em todas as instituições. Espero que votemos logo a reforma administrativa.
Folha - Como profissional de TV, quem o sr. prefere do ponto de vista artístico: Angélica, Xuxa ou Madonna?
Pires - Depois da regeneração, com "Evita", a Madonna. Apesar de ser fã da Angélica.

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