São Paulo, domingo, 19 de janeiro de 1997 |
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A HISTÓRIA DO AMOR DE ROMEU E JULIETA
ARIANO SUASSUNA
Romeu: "Eu tirei minha Gravata, ela tirou o Vestido. Eu, o cinto, com Revólver, ela seus quatro Corpinhos. As anáguas engomadas soavam nos meus ouvidos como um tecido de seda por vinte facas rompido. Eu toquei seus belos peitos que estavam adormecidos, e eles se ergueram, de súbito, como ramos de jacinto. Naquela noite eu passei pelo melhor dos caminhos, montado em Potrinha branca, mas sem Sela e sem estribos. Suas coxas me escapavam, como Peixes surpreendidos, metade cheias de fogo, metade cheias de frio". Julieta: "Ele tirou a Gravata, eu tirei o meu Vestido. Ele, o cinto, com Revólver, e eu, meus quatro Corpinhos. As anáguas engomadas soavam nos meus ouvidos como um tecido de seda por vinte facas rompido. Ele tocou nos meus Seios, que estavam adormecidos, e eles se ergueram de súbito, como ramos de jacinto. Naquela noite, corri pelo melhor dos caminhos, montada por um Ginete, mas sem Sela e sem estribos. Minhas coxas lhe escapavam, como Peixes surpreendidos, metade cheias de fogo, metade cheias de frio". Quaderna: Então, que imagine o público esta cena de noivado. O tempo em que estiveram aqueles dois abraçados. Quantos beijos, quantos toques, quantos êxtases trocados! O Dia já vinha entrando pela brecha da Alvorada. Eles, coitados, pensavam que inda era a Madrugada, e Romeu, feliz, beijava o corpo de sua Amada. Quando, porém, conheceram que o dia estava a chegar, Romeu disse a Julieta: Romeu: Eu inda estava a sonhar! Adeus! Nesta hora triste, eu parto, vou te deixar! Vamos viver separados, pois o Destino assim quis. Eu peço a Deus que te faça, no mundo, muito feliz. Eu partirei para o exílio: cumpro uma Sorte infeliz! Se algum dia tu souberes que eu, longe de ti, morri, murmura a Deus uma prece por quem tanto amou a ti. Derrama por mim teu pranto, que eu, por ti, muito sofri. Quanto a mim, também te juro que, se morreres primeiro, sobre o teu leito de morte eu virei, triste romeiro, dar, abraçado contigo, meu suspiro derradeiro. Eu estou sentindo um triste pressentimento de Morte. Minh'alma, como uma Nau que está perdida e sem norte, vagueia num Mar imenso, entregue a terrível sorte. Como vai ser triste e duro o tempo que vou passar longe de ti, Julieta, Adeus, enfim: vou seguir! Adeus: eu vou te deixar! Adeus, Verona, onde deixo meu Sonho, minha ilusão! Adeus casas, ruas, praças, e aves de arribação. Adeus, Julieta! Eu parto, mas fica o meu coração! Quaderna: Beijaram-se os dois amantes, se abraçaram docemente. Juraram que haveriam E afinal se separaram, chorando o Amor inocente. Logo após Romeu deixava a nobre e bela Morada. Julieta, soluçando, na Varanda debruçada, ficou até que Romeu se sumiu no pó da Estrada. Daquele dia em diante, Julieta não mais sorriu. Sonhando pelo Jardim, nunca mais ninguém a viu. pra canto nenhum saiu. Todos ficaram pasmados, perante aquela tristeza. Pensavam que era doença sua profunda frieza. Só à imagem de Romeu é que se mantinha presa. Um dia, seu pai chamou-a até a sua presença: Capuleto: Minha filha, escute aqui: eu quero que te convenças pra esta tua doença! Ontem, veio o Conde Páris te pedir em casamento. Por ser um moço de bem, dei-lhe o meu consentimento. Vou te apresentar a ele, dentro de poucos momentos. Julieta: Pai, não faça esta desgraça! Eu não quero me casar! Eternamente solteira, quero meus dias findar! Somente a você, meu Pai é que na vida hei-de amar! Capuleto: Não, minha filha, ouve bem: tu deves ter um Marido! Já dei meu consentimento e o voto será cumprido! Já tenho o Conde por genro, e um genro muito querido! Se não cumpres o mandado que agora te faço a ti, podes dizer para o mundo: "Para meu Pai, eu morri"! Pois nunca mais deitarei minha bênção sobre ti! Julieta: Paciência! Como Pai, o senhor faz o que quer! Mas eu, desse Conde Páris, nunca serei a Mulher! Desculpe, querido Pai: não posso lhe obedecer! Quaderna: Capuleto, furioso, Chegou a empurrar ao chão a pobre filha inocente. E, todo cheio de cólera, saiu de lá bruscamente. Julieta, em desespero, sua Criada chamou. Julieta: Vá me procurar o Padre que é o meu Confessor. Diga-lhe que, sem demora, venha aqui onde eu estou! Quaderna: Alguns momentos depois, quando o Padre ali chegou, Julieta, para ele, os seus desgostos contou. A cena que o Pai fizera, também toda relatou. Acabada a narração, o Padre pega a falar: Padre: Ah, filha, você não deve deixar-se desesperar! Acho que tenho um remédio que tudo pode evitar! Precisa muita coragem para o que vou lhe propor. Mas você não tenha medo: confie em Nosso Senhor! Escute então o que eu digo, pois meu plano vou lhe expor. Eu tenho, há muito, comigo, um frasco de dormideira. Se você tomá-la, fica morta uma semana inteira. Com ela, é que vou salvá-la! É assim, desta maneira: Você bebe a dormideira, e vão pensar que morreu. Seu Pai faz o seu enterro: quem vai celebrar, sou eu! Acabada a cerimônia, mando avisar a Romeu. Ele vem, leva seu corpo pra Mântua, terra do exílio. Talvez, depois, o seu Pai o receba como filho. Se assim for, vocês dois vão viver o seu idílio! Continua à pág. 5-7 Texto Anterior: A HISTÓRIA DO AMOR DE ROMEU E JULIETA Próximo Texto: A HISTÓRIA DO AMOR DE ROMEU E JULIETA Índice |
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