São Paulo, sexta-feira, 24 de janeiro de 1997
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Estilo FHC confunde e provoca versões

Presidente diz o que interlocutores querem ouvir

CLÓVIS ROSSI
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

Na noite de terça-feira, o senador Esperidião Amin (SC), presidente nacional do PPB, foi ao presidente Fernando Henrique Cardoso. Saiu certo de que o presidente quer o plebiscito, se a emenda da reeleição não puder ser votada na semana que vem.
Na noite seguinte, foi a vez do deputado André Franco Montoro (PSDB-SP). Saiu convencido de que FHC fechara com o referendo.
Tanto na terça como na quarta, Jorge Bornhausen, presidente licenciado do PFL, interlocutor habitual do presidente, jurava que estavam totalmente equivocados os que diziam que FHC quer o plebiscito ou o referendo.
Qual dos quatro mente? Nenhum e todos. O estilo do presidente é esse mesmo: passa a cada um de seus interlocutores a impressão de que está de acordo com tudo o que eles lhe dizem.
Um dos mais antigos amigos do presidente já havia feito essa descoberta há algum tempo, conforme ouviu a Folha: "O presidente sempre concorda comigo em tudo, mas nada acontece".
Uma ex-amiga, hoje adversária encarniçada, a economista Maria da Conceição Tavares, deputada pelo PT-RJ, fizera idêntica descoberta muito antes, no tempo em que FHC era apenas um sociólogo.
Conceição costuma contar que Fernando Henrique, em qualquer reunião acadêmica, tentava sempre fazer a síntese de posições absolutamente contrapostas.
Se, na reunião, estivessem um liberal empedernido e o mais fervoroso stalinista, ainda assim FHC tentaria a "síntese impossível", como diz Conceição.
O senador Sérgio Machado (CE), líder do PSDB, diz que não é bem assim: "O interlocutor acha mesmo que o presidente concordou com ele, mas está apenas interpretando mal o que ele disse".
É possível. O deputado Franco Montoro está em campanha aberta pela consulta popular (de preferência o referendo).
É da natureza humana sobrevalorizar qualquer palavra ou até mesmo um aceno de cabeça que reforce a posição que se defende e minimizar frases inteiras que sejam contrárias à tese.
É razoável supor que esse comportamento explique, ao menos em parte, porque a cotação do referendo ou do plebiscito ou de nenhuma dessas hipóteses suba ou desça conforme a posição do interlocutor do dia do presidente.
A seus auxiliares mais diretos, FHC vinha dizendo, até antes da convenção do PMDB emperrar a votação da emenda da reeleição, que não queria o plebiscito para não ser comparado ao presidente peruano Alberto Fujimori.
Fujimori fechou o Congresso, convocou eleição da qual não participaram os principais grupos de oposição, e o novo Congresso fez uma Constituição, depois submetida a referendo. Agora, no entanto, ele pode ser "o Fujimori sem golpe", como diz o publicitário Mauro Salles, assessor da presidência do PFL.
Traduzindo: os governistas estão tão convencidos de que há uma forte maioria popular a favor da reeleição e que um plebiscito aprovaria a tese sem que fosse preciso FHC fechar o Congresso.
Tudo somado, o presidente quer o plebiscito, o referendo ou nenhum dos dois? Responde o ministro da Educação, Paulo Renato, um dos íntimos de FHC:
"O presidente está ruminando tudo e elaborando na sua cabeça a alternativa (para o caso de não haver votação na próxima semana). Quem disser que sabe a alternativa escolhida, está mentindo".

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