São Paulo, segunda-feira, 27 de janeiro de 1997
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Reeleição com plebiscito

ERNANDO UCHOA LIMA

Em que pese o profundo respeito que devoto às opiniões contrárias à reeleição dos ocupantes dos cargos executivos -presidente da República, governadores e prefeitos-, não me convencem seus argumentos, nascidos, ao que parece, da injustificável desconfiança da capacidade de discernimento do eleitorado brasileiro.
Claro que a reeleição (refiro-me, obviamente, à situação brasileira) deveria ser precedida de um plebiscito, porquanto a pretendida mudança representaria o rompimento da nossa tradição constitucional e da nossa concepção republicana de governo. Demais disso, a prévia consulta popular, de natureza essencialmente democrática, daria maior legitimidade à reeleição.
Assim, desde que condicionada à realização do plebiscito, a adoção do princípio da reeleição seria uma inovação oportuna e até salutar, à medida que reconheceria o direito do povo de julgar, pelo voto, seus governantes. De outro lado, tornaria possível a continuidade de administrações realmente honradas, profícuas, voltadas para os superiores interesses da coletividade.
É de primeira evidência que só os bons governantes seriam reeleitos, pois os incompetentes ou desonestos estariam inexoravelmente derrotados no prélio das urnas, visto que o eleitorado jamais reconduziria um administrador desacreditado, do que resultaria alternância no poder.
Inconsistente, portanto, a alegação de que a renovação de mandatos executivos propiciaria o ressurgimento de oligarquias regionais. Ora, a realidade atual é bem diferente dos costumes políticos da chamada República Velha e em nada se compara com os tempos de Borges de Medeiros. De lá para cá, o mundo mudou, e o Brasil não é exceção. Vai longe a época das eleições a bico de pena. Agora, fruto da modernidade, vota-se com o emprego de computador.
Hoje, mercê das grandes transformações socioculturais e econômicas, dos enormes avanços científicos e tecnológicos, do imenso volume de informações dos veículos de divulgação, o brasileiro acompanha o que acontece no nosso planeta e sabe escolher o melhor para si e para os destinos da sua terra.
Igualmente irrelevante é a argumentação segundo a qual o governante que se candidatasse a um mandato consecutivo iria utilizar a máquina oficial para assegurar sua vitória. Infelizmente, essa vergonhosa e revoltante distorção já existe sem a reeleição, sabido que presidentes, governadores e prefeitos, com raras exceções, empregam todos os meios, alguns lícitos, outros ilícitos, com o objetivo de eleger seu sucessor.
Tal prática deletéria pode e deve ser eliminada, bastando para isso a adoção de regras severas e eficazes, a permanente vigilância da Justiça Eleitoral e a enérgica fiscalização da sociedade e da imprensa.
O que é inadmissível é a reeleição apenas para presidente da República, como pretendem alguns congressistas, movidos por indisfarçável desejo egoísta de um proveito pessoal, isto é, porque aspiram candidatar-se ao governo estadual ou municipal e temem concorrer com quem teve o mérito de realizar uma administração que obteve geral aprovação.
É óbvio que o princípio da reeleição se aplica a todos os detentores de cargos executivos. Bem de ver, portanto, que a exclusão de governadores e prefeitos seria uma decisão extremamente injusta, um intolerável casuísmo, por isso mesmo a merecer a mais veemente repulsa da sociedade brasileira.

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