São Paulo, terça-feira, 28 de janeiro de 1997
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Ações afirmativas e democracia

FLAVIA PIOVESAN

Democracia significa igualdade, no exercício dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais e culturais. Discriminação significa desigualdade, ou seja, toda distinção que tenha por objeto prejudicar ou anular o exercício dos direitos humanos fundamentais. Se democracia e igualdade se confundem, como eliminar a discriminação?
Essa é uma questão fundamental em face do cenário brasileiro, de forte padrão discriminatório. É dramático constatar que, embora as mulheres representem mais da metade da população, sua participação nas esferas sociais ainda esteja muito longe do desejável.
O mesmo vale para a comunidade negra, que representa 42% da população e se vê largamente excluída dos espaços sociais.
Como reagir a esse quadro? A primeira medida é proibir ações discriminatórias. Mas não basta apenas proibir a discriminação, mediante legislação repressiva. É preciso adotar estratégias que estimulem a inserção e inclusão desses grupos nos espaços sociais. A igualdade e a discriminação pairam sob o binômio inclusão-exclusão: a primeira pressupõe formas de inclusão e a segunda implica a violenta exclusão.
A proibição da exclusão, por si só, não resulta na inclusão. Como poderoso instrumento de inclusão social situam-se as ações afirmativas, medidas temporárias que, buscando remediar um passado discriminatório, objetivam acelerar o alcance da igualdade.
Essas ações cumprem uma finalidade decisiva ao projeto democrático, assegurando a diversidade e a pluralidade social, bem como a maior participação de grupos "vulneráveis" nas esferas político-sociais. Por meio delas, transita-se da igualdade formal para a igualdade material.
A adoção de tais medidas está prevista pelas convenções internacionais sobre a mulher (art. 1º, par. 4º, e art. 4º, par. 1º), ambas ratificadas pelo Brasil. A Constituição estabelece importantes dispositivos que demarcam a busca de igualdade material, destacando-se o art. 7º, inciso 20, sobre a proteção do mercado de trabalho da mulher. O Plano Nacional de Direitos Humanos também faz alusão às políticas compensatórias.
Ações afirmativas, igualdade e democracia compõem um trinômio indissociável, em que as ações afirmativas levam à igualdade, e esta assegura a democracia. Se a igualdade não é um dado, mas uma invenção histórica (como dizia Hannah Arendt), que possamos recriar o valor da igualdade com alternativas capazes de transformar a paisagem brasileira.

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