São Paulo, domingo, 12 de outubro de 1997
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Nenhum fundo de pensão paga impostos no Brasil

LUÍS COSTA PINTO
ENVIADO ESPECIAL A BRASÍLIA

Nenhum dos 348 fundos de previdência privada do Brasil paga impostos e tributos à União, aos Estados ou aos municípios. Juntos, eles têm um patrimônio calculado em R$ 82 bilhões.
Nos últimos seis anos, por estarem presentes em quase todos os leilões de privatização, os fundos ganharam a fama de "sócios do capitalismo" brasileiro dos anos 90. De 91 até setembro deste ano, já investiram R$ 2,26 bilhões na compra de ações de estatais privatizadas. Cálculos da Receita Federal indicam que esses fundos devem em impostos entre R$ 6 bilhões e R$ 8 bilhões.
A Receita quer receber os impostos dos fundos de pensão e previdência privada dos quais se considera credora. Conta com um aliado: o Supremo Tribunal Federal (STF), cujo plenário julgará no mês que vem uma ação contra o Previbosch, fundo de previdência da Bosch do Brasil.
Será o primeiro caso contra fundos de pensão e de previdência julgado em última instância no STF. Dois outros casos, contra a Caixa de Previdência da Usiminas e contra a Fundação Ceres (fundo de pensão dos empregados da Embrapa e Embrater) foram julgados pela primeira e segunda turmas do Supremo, compostas por cinco ministros do tribunal. Os fundos perderam.
Mesmo derrotados nas turmas do STF, nem a Caixa da Usiminas nem a Fundação Ceres passaram a recolher impostos. "Estamos com 'embargo de divergência'. Provisionamos os recursos, mas nem sequer fazemos depósitos judiciais do imposto que a Receita considera devido", revela Eduardo Sarmento, presidente da Ceres.
"Perdemos, estamos recorrendo e não estamos pagando", diz com desfaçatez Álvaro Luiz de Andrade, diretor administrativo da Caixa de Previdência da Usiminas.
"Esses fundos que perderam no Supremo os recursos judiciais e deveriam estar pagando impostos estão sendo devassados pela Receita", informa um dos assessores da Secretaria da Receita Federal em Brasília. E garante: "Vamos entrar com recursos contra cada um dos fundos, até que todos paguem tributos. Eles estão irregulares".
Mudança na Constituição
A polêmica entre a Receita e os fundos de pensão é um debate constitucional. A Constituição de 67, outorgada pela ditadura militar, concedia imunidade fiscal às entidades de assistência social.
A Constituição de 88, promulgada pelo Congresso Nacional, manteve essa imunidade, mas fez uma diferença entre entidades de assistência e de previdência social.
"A imunidade é para as entidades de assistência. Os fundos de pensão e de previdência estavam sob o abrigo da Constituição de 67 porque ela não diferenciava previdência de assistência social. Como os constituintes de 87 e 88 ressaltaram esta diferença, perde-se a imunidade", considera o ministro Carlos Mário Velloso, do Supremo Tribunal Federal.
O ministro Velloso foi um dos que julgaram contra a Caixa de Previdência da Usiminas e contra a Fundação Ceres. Vai julgar contra a Previbosch.
Essas decisões do STF não viram norma jurídica válida para todos os casos semelhantes, em benefício da Receita Federal, porque no Brasil não há o instrumento chamado "súmula vinculante", por meio do qual uma decisão do STF valeria como norma regente de todos as causas relativas ao mesmo princípio. "Se quiser receber impostos de todos os fundos, a Receita terá que acionar cada um deles", ressalta o ministro.
A Associação Brasileira das Entidades de Previdência Privada (Abrapp) quer recorrer das decisões judiciais contra seus associados. Para eles, a cobrança de impostos sobre patrimônio, negócios e ganhos financeiros dos fundos os tornaria pouco atraentes.
"Quase todos os países que têm fundos de previdência privada fechados concedem imunidade ou isenção tributária. Na Nova Zelândia, quando se começou a cobrar impostos dos fundos, a poupança interna caiu de 17,8% do Produto Interno Bruto (PIB) para 15% do PIB em função do desinteresse público pelos fundos. Isso é uma temeridade", argumenta Creston Portilho, assessor da Abrapp.
Ninguém paga
A Previ (Fundação de Previdência dos Funcionários do Banco do Brasil) e a Funcef (Fundação de Previdência da Caixa Econômica Federal) são os dois maiores fundos de pensão do país.
Juntos, dispõe de R$ 25 bilhões para investimentos. Além de entrar pesado nos fundos de privatização, também investem bastante nos mercados de ações e no mercado imobiliário. Não recolhem um tostão em impostos. Não pagam sequer o ITBI (Imposto de Transferência de Bens Intervivos) quando compram prédios ou salas comerciais.
A Centrus (Fundação de Previdência dos Funcionários do Banco Central), está entre os dez maiores fundos de previdência do Brasil. Também não paga um tostão em impostos, orientada pela Abrapp.
"Lutamos pela imunidade. Fazemos a provisão no nosso balanço para a eventualidade de ter que pagar os impostos, mas não realizamos depósitos judiciais", esclarece Isabela Amaral, da Centrus.

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