São Paulo, domingo, 19 de outubro de 1997
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Estudo derruba mitos sobre menor de rua

ANDRÉ LOZANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Uma pesquisa inédita desenvolvida pela Faculdade de Saúde Pública da USP (Universidade de São Paulo), com financiamento do Ministério da Justiça, derruba dez mitos relacionados às crianças de rua e suas famílias.
"A pesquisa mostra que, ao contrário do senso comum, as famílias das crianças em situação de rua são estruturadas e seus membros não são desempregados, vagabundos ou malandros", disse o sociólogo Rubens Adorno, professor da Faculdade de Saúde Pública e coordenador da pesquisa.
O trabalho foi anunciado na sexta-feira para representantes do Unicef (órgão da ONU para a infância), da Febem (Fundação Estadual do Bem-Estar do Menor) e para professores universitários.
A pesquisa ouviu 390 familiares de menores internados na Febem, entre março e junho deste ano.
Esses são, segundo Adorno, os mitos desbancados pelo estudo:
1 - As famílias que geram crianças de rua não habitam lugares precários: 77,7% delas moram em locais com infra-estrutura completa (com água, esgoto, coleta de lixo, asfalto e iluminação). Das famílias que moram em casas (52,7%), 86% habitam residências de alvenaria. Apenas 15,4% vivem em favelas.
2 - Os pais de menores de rua moram em casa própria (66,8%).
3 - A maior parte das crianças que optam pela rua vive com os pais legítimos (74%).
4 - No momento da internação na Febem, as crianças não viviam sozinhas nas ruas (19,2%), mas com suas famílias (68,5%).
5 - Os infratores não moram em casas superlotadas: 78% das casas têm até três pessoas por cômodo.
6 - Os infratores não resultam de famílias com muito filhos, que não teriam estrutura para cuidar de tantas crianças: 62% das famílias têm entre um e dois filhos.
7 - Não são criadas em lares miseráveis, mas "apenas pobres" (56,8% dos pais recebem entre um e cinco salários mínimos).
8 - A grande maioria dos pais era assalariada (72,6%), mas o impacto do desemprego reduziu esse índice para 35,5%. Desempregados passaram de 2,3% para 17,3%, mas nunca chegaram a ser maioria.
9 - A maior parte dos pais é de São Paulo (56,6%) e não de outros Estados. Os nordestinos, por exemplo, são minoria (14,4%).
10 - Por último, os pais dos infratores têm a religião como principal atividade comunitária: 44% frequentam cultos evangélicos e 24%, cultos católicos.
"Os dados mostram que não é a estrutura familiar que gera crianças em situação de rua, mas a falta de locais públicos de lazer, cultura e educação, que deveriam preencher o tempo ocioso desses jovens", disse Adorno.
Membro dessa categoria estigmatizada como "menor de rua", o jovem Antonio Leonardo Duarte Pereira, o Léo, 18, conta que quer abandonar as ruas para se transformar em fotógrafo profissional.
Mesmo fazendo parte do projeto Meninos e Meninas de Rua, de São Bernardo do Campo (Grande SP), o garoto ainda não conseguiu alcançar seu sonho, embora já esteja apostando nele ao comprar, em seis prestações, uma câmera fotográfica de R$ 336.
Conheça nas páginas 6 e 7 o trabalho que esse ex-menino de rua produziu retratando com sua câmera o mundo em que vive.

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