São Paulo, quinta-feira, 30 de outubro de 1997
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Queda nas Bolsas, foguetório em Brasília

ALOYSIO BIONDI

No Palácio do Planalto, festeja-se a queda nas Bolsas e soltam-se foguetes diante da crise financeira internacional. Claro, óbvio. Com o terremoto mundial, o governo FHC vai encontrar uma desculpa para o caos em que a economia brasileira mergulhou, por arte e engenho da equipe econômica.
Na realidade, há três anos o Brasil vem enfrentando a destruição de sua indústria, o desemprego galopante, o avanço do "rombo" da balança comercial, a perda de poder aquisitivo da população (repetindo: os 10% mais pobres da Grande São Paulo perderam 15% do seu poder aquisitivo no primeiro semestre deste ano). Vale dizer: a economia brasileira já estava no fundo do poço antes mesmo da crise internacional. Mas essa crise vai servir de álibi para o governo FHC, apesar das provas em contrário que surgem todos os dias.
Samsung - Anunciou, conforme esta Folha, o adiamento de investimentos em sua fábrica de aparelhos da linha branca (geladeiras etc.) no interior de São Paulo. Motivo (exatamente o previsto há meses por esta coluna): superdimensionamento do mercado brasileiro pelas multinacionais (na verdade, superdimensionamento de todo o mercado mundial). Consequência: não haverá a entrada de dólares prevista, nesse e em outros casos.
Automóveis - A mesma Samsung anuncia que não pretende produzir carros no Brasil porque, prevê, haverá superprodução e desabamento de preços já em 1998 (quando esta coluna fez essa previsão, há meses, um porta-voz da Anfavea disparou foguetes contra a análise "catastrofista"...) Consequência: a redução no ritmo de investimentos das demais montadoras já deve estar decidida, na surdina. Menos ingresso de dólares.
Desemprego - A equipe econômica e formadores de opinião insistem na tecla de que o desemprego avança apenas em São Paulo e que há expansão do mercado de trabalho em outros Estados, com reportagens especiais em revistas nacionais e, claro, nos jornais da TV e tudo.
Na segunda-feira, o IBGE, do governo FHC, divulgou os dados estatísticos sobre o desemprego industrial em agosto (obviamente, escondidos pelos meios de comunicação). Resultado: queda em todas as regiões, respectivamente de 0,4% no Nordeste; 0,9% em Minas Gerais; 1,4% no Rio de Janeiro e 1,5% na região Sul. Pois é.
Agricultura - 1
Em entrevista na quarta-feira, dia 22, o ministro da Agricultura, Arlindo Porto, divulgou os resultados da primeira pesquisa sobre as "intenções de plantio", por parte dos produtores, para a safra 1997/98, isto é, as colheitas do próximo ano. Resultado? Vai haver redução na área plantada. Por quê? Falta de crédito para o produtor. Ou falta de preços compensadores, na colheita deste ano, porque o governo FHC, desde 1995, não compra mais a colheita dos produtores, com base no preço mínimo. Deixa o produtor na mãos dos atravessadores. Deixa quebrar, a pretexto de forçar a "modernização" do setor -exatamente como fez com a indústria.
Agricultura - 2
As colheitas do próximo ano são decisivas para o país por vários motivos: a exportação de "excedentes" representaria mais dólares e redução do "rombo" da balança comercial; a eventual necessidade de importações aumentará o "rombo"; a criação de renda e empregos no interior daria uma injeção de ânimo na economia.
Apesar disso tudo, a entrevista do ministro não ganhou absolutamente nenhuma atenção da imprensa -que continua a dar mais espaço a atividades charmosas (modernidade?) como "franchising" do que à agricultura, que envolve milhões de famílias e é uma das bases da economia. Ah, sim: bem de acordo com o estilo raffiné, da equipe FHC, o ministro Arlindo Porto, dito-da-Agricultura, não ficou nem um pouco preocupado com a perspectiva de safras menores. Ele disse, com otimismo, que mesmo assim a renda da agricultura pode crescer. Por quê? Porque com a colheita menor, sobretudo de milho, os preços vão subir e o produtor vai receber mais (e o consumidor?). Junto com o milho, sobem os preços das rações, boi, porco e frango. Mais uma vitória da equipe FHC.

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