São Paulo, domingo, 2 de novembro de 1997
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Homeopatia no tribunal

CHARLES SEIFE
DA "NEW SCIENTIST"

Dois cientistas ganhadores do Prêmio Nobel estão sendo processados por difamação por Jacques Benveniste, o controvertido cientista francês cuja pesquisa sobre a chamada "memória da água", publicada pela primeira vez em 1988, propunha fornecer um fundamento científico para a homeopatia.
Benveniste se nega a citar os nomes das pessoas que está processando. Mas a "New Scientist" apurou que entre seus alvos figuram Georges Charpak e François Jacob. Charpak ganhou o Prêmio Nobel de Física em 1992 por seu trabalho sobre os detectores de partículas no Cern (Centro Europeu de Pesquisa Nuclear), com sede perto de Genebra, na Suíça. Jacob, que trabalha no Instituto Pasteur, em Paris, recebeu o Nobel de Medicina de 1965 por seus estudos sobre a genética molecular. O terceiro réu no processo é Claude Hennion, físico da Escola de Física e Química Industrial, em Paris.
Os três cientistas fizeram comentários desfavoráveis sobre Benveniste numa série de artigos publicados pelo jornal francês "Le Monde", em janeiro. Benveniste está decidido a refutar qualquer sugestão de que tenha sido intelectualmente desonesto. "Se disserem que sou mau cientista, não terei razão para processar", diz ele. "Se disserem que sou uma fraude, eu processo." "O processo não me assusta", diz Hennion. "Mas vai me fazer perder muito tempo." Charpak e Jacob não fizeram comentários.
Em 1988, Benveniste afirmou que a água retém a "memória" das substâncias nela dissolvidas, mesmo depois de a solução ser diluída a ponto de não restar na água uma única molécula da substância em questão. É o conceito subjacente à prática da homeopatia, na qual se supõe que água "ativada" tenha o poder de curar doenças.
A pesquisa de Benveniste, publicada na "Nature", descreveu respostas imunológicas apresentadas por células humanas a soluções de alérgenos repetidas vezes diluídos.
Seu trabalho provocou muita controvérsia, sobretudo depois que o editor da "Nature", John Maddox, visitou seu laboratório acompanhado pelo mágico e pesquisador de fenômenos paranormais James Randi e por Walter Stewart, pesquisador dos Institutos Nacionais de Saúde, perto de Washington, que já investigou várias experiências contestadas. Depois de observar o trabalho sendo repetido, Maddox e seus colegas qualificaram as conclusões de Benveniste de "ilusórias". Disseram que suas afirmações se basearam "principalmente numa extensa série de experimentos estatisticamente mal controlados".
O laboratório de Benveniste foi fechado pelo Inserm, órgão francês responsável por pesquisas médicas. Mas ele ainda trabalha como diretor do Laboratório de Biologia Digital, financiado com recursos privados e sediado no mesmo campus em Clamart, ao sul de Paris. Em experiências recentes, ele afirma haver transmitido a "memória" da água por e-mail.

Tradução de Clara Allain

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