São Paulo, sábado, 8 de novembro de 1997
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Presidentes vêem Mercosul como uma arma anticrise

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

Os presidentes Carlos Menem (Argentina) e Fernando Henrique Cardoso (Brasil) emitirão na segunda-feira uma declaração conjunta em que se comprometem a dar novo impulso ao Mercosul, apontando-o, entre outras coisas, como um anteparo contra a instabilidade global.
Os dois presidentes não entrarão em maiores detalhes a respeito, até porque sabem que o Mercosul (o bloco comercial que inclui também o Paraguai e o Uruguai), por mais aperfeiçoado que seja, não evitará crises como a detonada no último dia 23, quando foram registradas quedas nas Bolsas de Valores de todo o mundo.
Mas a idéia é emitir uma mensagem política, cuja essência é simples: a integração regional, se não evita crises externas, ajuda a reduzir seus efeitos.
No caso da Argentina, há números para provar a tese: o déficit comercial (importações superiores às exportações) será este ano de cerca de US$ 4 bilhões.
Mas, com o Brasil, a Argentina terá um superávit de aproximadamente US$ 1,8 bilhão até o final do ano.
Fica fácil demonstrar, por aí, que, sem as facilidades que o Mercosul oferece à entrada da produção argentina no Brasil, a vulnerabilidade externa da Argentina seria bem maior.
No caso do Brasil, como é óbvio, a estatística se inverte. Mas a ênfase será posta no aspecto político da integração regional: ela cria um mercado mais amplo e dá maior margem de manobra para todos os países-membros, ante conjunturas externas delicadas como a atual.
O presidente brasileiro, aliás, já tocou, de passagem, no espírito da declaração conjunta, durante a entrevista coletiva que concedeu na última quarta-feira.
Disse FHC: "Estamos demonstrando que o Mercosul e os países da América Latina têm maior capacidade de reação às emergências e são capazes de sair de eventuais turbulências mais fortes".
Acrescentou: "Poderão, na competição com outras áreas do planeta, atrair mais recursos".
Mercado comum
O fato de se ter incluído a declaração conjunta na pauta do encontro Menem/FHC é, em si, uma resposta política à crise global.
Até que ela se instalasse, a idéia era a de emitir apenas um comunicado resumindo os pontos da agenda bilateral, no que funciona como uma espécie de ata burocrática desse tipo de evento.
Já a declaração conjunta é usada para dar ênfase política aos pontos que os presidentes querem ressaltar. Menem e FHC querem enfatizar a disposição de aprofundar o Mercosul, de modo a transformá-lo, o mais cedo possível, em um verdadeiro mercado comum.
Mercado comum significa plena liberdade para o movimento de bens, serviços e pessoas entre os países-membros. O Mercosul, até agora, prevê a liberdade apenas para o movimento de bens, assim mesmo com exceções, embora com data marcada para acabar.
O passo seguinte é um acordo na área de serviços, o que inclui desde bancos a seguros de saúde.
O acordo de serviços está em fase adiantada de negociação e diplomatas de ambos os lados imaginam que poderá ser assinado na cúpula semestral do bloco, prevista para dezembro em Montevidéu.
O aprofundamento do Mercosul não será tratado apenas como um anteparo, ainda que precário, contra crises internacionais.
A declaração conjunta é também a primeira tomada de posição conjunta de Brasil e Argentina em relação à Alca (Área de Livre Comércio das Américas), após a visita do presidente norte-americano Bill Clinton a ambos os países.
Por mais que Clinton tenha derramado elogios ao Mercosul, nas negociações posteriores sobre a Alca, realizadas na Costa Rica, reapareceram as restrições dos EUA ao Mercosul.
O documento Menem/FHC destina-se, por isso, a sepultar de vez a suspeição de que os dois países poderiam ter divergências nas negociações sobre a Alca, com os argentinos se aproximando mais da posição norte-americana.
Menem e FHC vão reafirmar que o Mercosul é uma "aliança estratégica", que veio para ficar e não será, assim, dissolvida na futura Alca, se e quando esta for criada.

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