São Paulo, domingo, 9 de novembro de 1997
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Perseguidor traumatiza sua vítima

ADRIANA VIEIRA
e MARIANA SGARIONI

ADRIANA VIEIRA; MARIANA SGARIONI
DA REVISTA DA FOLHA

No início, pessoa não dá atenção

Quarta-feira, 22h55. O telefone toca na casa da bióloga Maria de Fátima Mascarenhas Ribeiro. Exausta depois de um dia de trabalho, ela atende apreensiva. "Por que demorou para atender? Não sabe que eu vou te matar?", diz uma voz masculina.
Maria de Fátima desliga. Às 23h19, o telefone toca de novo. "Não adianta desligar, eu vou te matar." Ela bate o telefone. Exatos cinco minutos depois, o mesmo homem, agora com a voz mais enfurecida: "Vagabunda, pode preparar o seu próprio enterro".
A cena se repetiu durante quase um ano na vida de Maria de Fátima, 36, perseguida por um homem com distúrbios mentais, o desempregado José Luiz da Silva.
Em abril de 1995, eles se conheceram, no shopping Eldorado, durante uma demonstração de arco e flecha, esporte que ela pratica nas horas vagas. José estava lá para aprender e ficou encantado com a professora, muito atenciosa.
Esse único encontro foi suficiente para transformar Maria de Fátima em alvo da obsessão de José Luiz. Além dos telefonemas incessantes nos horários mais absurdos, ele chegou a segui-la nas ruas.
"No início, não dei bola, porque ele dizia só coisas sem sentido. Pensei que fosse um louco qualquer. Depois, fiquei com muito medo, porque ele começou a descrever todos os lugares que eu frequentava: o meu laboratório, lojas, clube... Foi aí que decidi procurar a polícia", lembra.
Histórias de perseguição como essa, que parecem roteiro de filme de suspense, não têm nada de ficção para centenas de paulistanos. Alvos de fãs obcecados, ex-namorados inconformados, funcionários insatisfeitos ou simples desconhecidos, os "perseguidos" vêem, de um dia para o outro, suas vidas se transformar em inferno.
Desprezando as ameaças no início, a maioria das vítimas termina tolhida pelo medo, mudando seus hábitos, evitando alguns ambientes e desconfiando de amigos antigos e vizinhos.
"Em geral, os ameaçados conhecem ou já tiveram algum tipo de relação com seus perseguidores", afirma o delegado-titular Baldomero Cortada Neto, da 1ª Delegacia da Divisão de Proteção à Pessoa, criada há dois anos justamente para atender a esses casos. Até hoje, foram registradas 285 denúncias na delegacia, ainda pouco conhecida pelos paulistanos.
Nos cálculos de Cortada Neto, o número de "perseguidos" deve ser muito maior. "Só quando a história já foi longe demais, as pessoas procuram a polícia", diz.
A bióloga Maria de Fátima se encaixa nesse perfil. Ela aguentou as ameaças -diárias- por nove meses. José Luiz ligava, contava o que havia feito ("fui ao show da Simony", "encontrei minha avó") e chegou a se inscrever na federação de arco e flecha onde ela treinava.
Ela não falava nada ao telefone. Até o dia em que resolveu procurar a ajuda de um amigo policial.

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