São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 1997
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Argentinos temem desvalorização do Real e novas restrições a importações

ELIANE CANTANHÊDE; FERNANDO GODINHO
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA

Diplomatas e empresários discutem em churrasco no sábado como pacote pode afetar país vizinho

A possibilidade de uma desvalorização cambial no Brasil e o anúncio, no pacote de hoje, de novas medidas de restrição às importações.
Esses foram os dois principais temores manifestados por diplomatas, funcionários e empresários argentinos durante um "asado" (churrasco) oferecido no sábado à noite a 350 pessoas em Brasília.
A festa foi realizada a 28 horas da chegada do presidente Carlos Menem ao Brasil -prevista para a 1h de hoje- e a 36 horas do anúncio do pacote econômico brasileiro.
O embaixador da Argentina, Jorge Hugo Herrera Vegas, disse à Folha que não sabia o que Menem e o presidente Fernando Henrique Cardoso haviam conversado naquele dia, na Venezuela, sobre o "pacote" brasileiro. Ele, porém, não acreditava em desvalorização nem em contenção das importações.
"A legislação brasileira para comércio exterior é atrelada ao Mercosul", justificou ele, destacando que os países integrantes do bloco não podem tomar medidas unilaterais nessa área.
Mesmo sem medidas formais, porém, o embaixador admitiu que seu país poderá ser naturalmente afetado pelas dificuldades brasileiras decorrentes da crise das Bolsas.
"As exportações argentinas poderão cair em decorrência da redução da atividade econômica interna do Brasil", disse ele.
Cerca de 30% das exportações da Argentina são para o Brasil, especialmente de veículos (US$ 1,63 bilhão neste ano, até setembro), combustíveis (US$ 979 milhões) e trigo (US$ 721 milhões). Qualquer sinal de recessão no Brasil tem reflexos diretos lá.
Herrera Vegas e boa parte dos argentinos presentes ao "asado" -inclusive alguns que estavam em Brasília especificamente para a visita de Menem- estavam convencidos de que o governo brasileiro não anunciaria nada hoje que prejudicasse o Mercosul e a Argentina, em particular.
"Seria falta de educação com o presidente Menem", disse um diplomata do Palácio San Martin, a chancelaria argentina.
Ao contrário, todos estavam convencidos de que o presidente argentino acabaria dando declarações públicas de apoio às medidas brasileiras. O objetivo de Menem e FHC, neste momento, é fortalecer o Mercosul.
Herrera Vegas foi o anfitrião do "asado", realizado no hotel de Trânsito dos oficiais do Exército, no Setor Militar Urbano.
O verdadeiro motivo da festa não foi a chegada de Menem -prevista para a 1h de hoje-, mas o "Torneio de Golfe República da Argentina", do qual participam principalmente diplomatas.
Entre os 350 convidados, a principal autoridade brasileira era o secretário-geral do Itamaraty, embaixador Sebastião do Rego Barros. Com a camisa azul e branca do torneio de golfe, ele brincava: "Vesti a camisa da Argentina".
Compareceram, ainda, o secretário de Política Industrial do MICT (Ministério da Indústria, do Comércio e do Turismo), Antônio Sérgio, e o secretário de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, Roberto Jaguaribe.
Eles admitiram que as duas principais perguntas dos argentinos eram sobre desvalorização cambial e sobre novas restrições às importações. Antônio Sérgio é responsável pela área do MICT que cuida de tarifas, cotas e outros instrumentos de comércio internacional que interessam diretamente ao Mercosul. Ele garantiu que não conhecia as medidas em estudo pela cúpula econômica, mas que não acreditava em alterações drásticas na área de comércio exterior.
Como "alterações drásticas" considerava medidas restritivas que contrariassem acordos com o Mercosul ou que pudessem criar constrangimentos ao Brasil junto a entidades internacionais de comércio, como a OMC (Organização Mundial de Comércio).
Os diplomatas argentinos alternavam garfadas de boa carne e cochichos sobre as dificuldades dos dois países diante da crise financeira internacional.
Na bolsa de apostas sobre as medidas que o Brasil tomaria, três eram as mais citadas pelos argentinos: fim de boa parte das atuais isenções fiscais; corte do Orçamento e aumento de impostos.

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