São Paulo, segunda-feira, 10 de novembro de 1997
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LaBruce defende 'vida no armário'

JACKSON ARAUJO
free-lance para a Folha
SUZY CAPÓ

JACKSON ARAUJO; SUSY CAPÓ
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Cineasta canadense participa hoje do debate "Produção Independente" e exibe longa realizado em 1990

Com uma presença basicamente de público masculino durante o fim-de-semana, o 5º Festival Mix Brasil da Diversidade Sexual continua sua maratona até a próxima quinta-feira.
Entre as diversas atrações de hoje, acontece no auditório do MIS, às 17h, o debate "Produção Independente", com os convidados internacionais Roland Tec, Shari Frilot, Hiroaki Sato e Bruce LaBruce, que tem surpreendido o público do evento com seus filmes.
O canadense Bruce LaBruce é um dos expoentes da cena gay underground internacional. Com vários curtas filmados em super 8 e três longas lançados e distribuídos em diversas partes do mundo, o diretor apresenta no festival uma retrospectiva de seus principais trabalhos: "O Cabeleireiro e o Skinhead" (90), "Super 8 1/2" (94) e "Hustler White" (96).
Enquanto levanta recursos para seu próximo filme, LaBruce se dedica à direção de videoclipes de bandas de rock em Toronto. Leia a seguir trechos da entrevista à Folha, em que o cineasta conta como saiu de uma fazenda no Canadá para tornar-se um diretor cult.
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Folha - Como tudo começou?
Bruce LaBruce - Aos 18 anos, fui estudar cinema em Toronto. Frequentava a cena punk, fazia filmes em Super 8 e editava um fanzine. Bruce LaBruce foi criado naquele fanzine, que contestava a cena gay conservadora e a cena punk homofóbica.
Folha - Por que optou por uma estética trash e pornô?
LaBruce - Saí da cena punk em que predominava uma estética agressiva contra o conservadorismo dos anos 80. Acho que eu levo adiante a tradição dos filmes de Warhol, Jack Smith e Pasolini. Acredito que o artista homossexual tem que lidar com imagens sexuais, pois fazem parte da identidade gay como um todo. Os gays são identificados pela sua sexualidade. Fazer filmes pornográficos é como dar às pessoas o que elas estão pedindo. Aliás, muito mais do que elas estão pedindo.
Folha - Você declarou à revista "Gay Times" que a vida "no armário" é mais divertida.
LaBruce - De fato. Acho que a venda do modo de vida gay para a América vai contra o impulso original do homossexualismo, que é meio subversivo. Nos anos 50 e 60, a cena gay underground era um lugar para pessoas rejeitadas pelo mainstream. Agora, é um outro estilo de heterossexualismo. Como homossexual você pode ver a sociedade mais objetivamente. O armário possibilitava uma vida dupla, de onde você podia entrar e sair, como um espião.
Folha - Por que não há mulheres no filme "Hustler White"?
LaBruce - Elas foram excluídas propositalmente, para apresentar a visão dos bofes que gostam de ver o mundo sem mulheres. Era também uma provocação ao feminismo conservador vigente nos Estados Unidos.
Folha - Você compartilha das idéias de Camille Paglia?
LaBruce - Sim. Fui muito influenciado por ela. Ela foi um importante instrumento contra o feminismo ortodoxo. Ousou dizer coisas que eu não teria coragem de dizer. Diz que não há motivos para que homossexuais reprimam os seus impulsos heterossexuais e que a homofobia é mais uma questão de medo que de ódio, um recurso da natureza contra o fim da espécie humana.
Folha - O que pensa sobre a homofobia?
LaBruce - Geralmente sou mal-interpretado quando falo sobre homofobia. Tachar uma pessoa homofóbica de ruim é ingênuo. O homossexualismo é muito ameaçador, pois todas as pessoas têm um impulso homossexual. Para entender a homofobia, é necessária uma perspectiva filosófica mais abrangente.
Folha - O que acha da união civil entre homossexuais?
LaBruce - Sou indiferente. Essas coisas só beneficiam às pessoas que já têm dinheiro. O casamento é uma instituição heterossexual, que me parece não-natural para homossexuais.
FolhaE seu próximo projeto?
LaBruce - É o filme "Come As You Are", sobre a indústria pornográfica gay de Los Angeles.

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