São Paulo, sábado, 15 de novembro de 1997 |
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Prisão do Planet Hemp foi abusiva, dizem especialistas
EUNICE NUNES
Além disso, a prisão dos músicos leva a uma reflexão sobre como as leis devem ser interpretadas. No caso dos rapazes do Planet Hemp, que defendem a legalização da maconha, trata-se de garantir a livre manifestação do pensamento, um direito constitucionalmente consagrado, apesar de a Lei de Tóxicos (lei nº 6.368/76) punir quem "contribui de qualquer forma para incentivar ou difundir o uso indevido ou o tráfico ilícito de entorpecente". Maurides de Melo Ribeiro, presidente do Conselho Estadual de Entorpecentes (Conen) de São Paulo, diz que a liberdade de expressão é um direito fundamental num estado de direito democrático e, por isso, não pode ser cerceado. "Não podemos abrir mão da liberdade de expressão. A leitura ao pé da letra da Lei de Tóxicos pode até justificar a prisão, mas numa interpretação à luz da Constituição não vinga. A liberdade de opinião, principalmente em produto cultural, está acima da lei ordinária", afirma Ribeiro. "Defender a legalização não é fazer apologia, nem difundir ou incentivar o uso da maconha. É apenas uma opinião que, aliás, não é só deles, é também a de alguns juristas e médicos", argumenta Alberto Zacharias Toron, advogado criminalista. Ele cita uma passagem do "Compêndio de Psiquiatria Dinâmica", de Harold Kaplan e Benjamin Sadock, professores da Faculdade de Medicina da Universidade de Nova York, que diz: "O uso moderado da maconha não provoca deterioração física ou mental"(pág. 452, Editora Artes Médicas, 1984). Segundo Toron, os músicos apenas retratam o que o mundo científico hoje pensa a respeito da maconha. "Isso não se confunde com apologia ou indução ao uso da droga. A prisão deles foi uma violência, pois baseou-se numa interpretação arbitrária das letras das músicas da banda", afirma. Luiz Flávio Gomes, juiz da 26ª Vara Criminal de São Paulo, considera a prisão dos integrantes do Planet Hemp um exagero. "Quantas músicas não falam de drogas? Não existe aí a intenção de prejudicar, traficar ou outra coisa mais grave. O propósito é suscitar a discussão da descriminação que, aliás, está sendo debatida no Congresso Nacional, em seminários internacionais dos quais participam autoridades e também nas escolas", argumenta Gomes. Os três especialistas citaram a discussão sobre o aborto como exemplo próximo do debate sobre as drogas. Para eles, defender a descriminação do aborto não é crime, assim como não cometem crime pessoas que admitem, em entrevistas, ter praticado o aborto. "Para resolver questões tão graves como essas não podemos ser hipócritas. É preciso que sejam discutidas abertamente. Só o conhecimento e a educação resolvem", conclui Maurides Ribeiro. Texto Anterior: Fila e pastor alemão atacam mais Próximo Texto: Europa adota descriminação Índice |
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