São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997
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Para Incra, governos fiscalizaram mal

BERNARDINO FURTADO
DO ENVIADO ESPECIAL A SÃO LUÍS E CUIABÁ

O diretor de Recursos Fundiários do Incra, Luiz Fernando Pimenta, afirmou à Folha que o ganho que os donos de terra na fronteira agrícola brasileira estão tendo com desapropriações para reforma agrária é reflexo dos fortes subsídios concedidos na venda dessas áreas nas décadas de 70 e 80.
Quem concedeu esses subsídios foram governos estaduais e a União. Segundo Pimenta, em geral, os preços que o Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) está propondo pagar atualmente estão dentro da realidade de mercado.
Pimenta diz que os governos estaduais e a União pecaram na fiscalização do cumprimento das cláusulas dos contratos de venda das terras. Esses contratos obrigavam os compradores a implantar projetos agropecuários produtivos, sob pena de reversão da propriedade para o Estado.
Segundo Pimenta, essas cláusulas caducaram, permitindo aos donos registrar em cartório as escrituras definitivas das áreas sem necessidade de comprovar investimentos e produção.
"Por isso, os Estados e a União não têm mais como retomar as terras, caso constatem que elas são improdutivas, e o Incra é obrigado a pagar indenização tanto pelas terras quanto por benfeitorias implantadas pelos proprietários."
Na sua opinião, a inoperância do Incra em governos passados também custou ao programa de reforma agrária a perda de pelo menos 2,13 milhões de hectares (21,3 mil km²) de terras no Mato Grosso.
Essas terras se tornaram públicas na década de 70 por decretos presidenciais nos governos Emílio Garrastazu Médici (1969-74) e Ernesto Geisel (1974-79).
Essa é a área que sobrou dos 6,77 milhões de hectares obtidos pelo Incra com base nos decretos de Médici e Geisel, segundo o superintendente do Incra no Mato Grosso, Elarmim Miranda.
Pimenta diz que o Incra não deu destinação a essas terras e boa parte delas acabou sendo ocupada por grandes fazendas.
"Agora, a retomada dessas terras depende de demorados e onerosos processos judiciais, e, de todo modo, o Incra terá de indenizar as benfeitorias feitas pelos fazendeiros", diz Pimenta.
Segundo ele, por esse motivo, o Incra está desapropriando grandes latifúndios improdutivos no norte do Mato Grosso e comprou nove fazendas produtivas no sul do Estado. No caso das desapropriações, Pimenta diz que o Incra está contestando judicialmente as tentativas dos proprietários de obter indenizações por florestas nativas.
"Embora a Justiça Federal tenha dado ganho de causa para os proprietários em uma série de processos num passado recente, o Incra atualmente está contestando de forma segura esse tipo de distorção, sustentando nos processos que o valor das florestas não pode ultrapassar o valor total que a propriedade alcançaria se fosse vendida, considerando os valores de mercado da região", diz Pimenta.
O diretor do Incra reconhece a baixa viabilidade econômica dos projetos de assentamento que estão sendo implantados no norte do Mato Grosso. No entanto, segundo ele, esses projetos estão contemplando trabalhadores miseráveis que, tendo terra para agricultura de subsistência, já estarão conquistando uma melhoria nas suas condições de vida. "Estamos falando de um público da reforma agrária menos qualificado."
Segundo Pimenta, o MST constitui um público diferente para a reforma agrária porque defende a necessidade de os projetos de assentamento terem agroindústria e inserção nos grandes mercados consumidores.
"O MST tem de entender que o programa de reforma agrária não pode excluir áreas onde há demanda por terra só porque as condições locais não permitem num primeiro estágio a implantação de uma agricultura moderna", diz Pimenta.
O diretor do Incra argumenta que foi justamente para atender à reivindicação do MST que o órgão comprou nove fazendas produtivas no sul do Mato Grosso em 95 e 96. Ele diz que não fazem sentido as suspeitas de superfaturamento que levaram o Ministério Público Federal a investigar essas compras.
Segundo ele, é muito possível que atualmente o Incra consiga comprar fazendas com as mesmas características a preços mais baixos porque os critérios de avaliação de terras foram corrigidos para baixo graças a alterações na legislação.
"Com base nas regras de 96 o preço pago pelas fazendas foi justo,", afirma.

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