São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997
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Religiosa cuida de mal de Hansen

DA REVISTA DA FOLHA

Também foi a revolta que levou a religiosa Natália Dornellas, 80, a se dedicar aos doentes do mal de Hansen.
"Resolvi me oferecer depois de ver um paciente ser praticamente expulso do hospital onde eu trabalhava", conta.
Há 54 anos, quando ainda se chamava a hanseníase de "lepra" e os doentes viviam isolados, a religiosa começou a tratá-los.
"Saí do noviciado e fui trabalhar em um hospitalzinho de Rio Casca, em Minas Gerais. Um dia, chegou um hanseniano e os médicos fizeram um barulhão, dizendo que precisavam tirá-lo logo de lá. Naquele tempo, a lepra era tabu", conta a religiosa.
"Esse homem ficou internado só uma noite e não sei quem chorava mais, se era ele ou eu. Aquilo me comoveu de uma maneira que senti que deveria viver no meio deles para ajudá-los. Foi então que me ofereci para trabalhar aqui na colônia, em 1943", diz Natália.
Localizada na zona rural de Goiânia, a Colônia Santa Marta atende hoje 300 portadores do mal de Hansen, além de ajudar as famílias dos doentes.
Na época em que a irmã se mudou para lá, não havia como contratar funcionários, porque ninguém se dispunha a chegar perto dos doentes.
"Tivemos quase 2.000 pessoas internadas aqui. Como éramos só as irmãs, tínhamos de fazer todo tipo de serviço, de cozinhar a colocar os piores curativos", conta Natália.
A saída foi a mesma usada por Aparecida: ensinar os pacientes em melhor estado a cuidar dos que estavam piores. As freiras trabalharam 20 anos nessas condições. Só nos anos 70 foram contratados os primeiros funcionários. Mas o preconceito continua.
Provocada por um micróbio, a hanseníase ataca os nervos da pele, provocando manchas, feridas em carne viva e perda da sensibilidade. O "leproso" se queima e esmaga os dedos, porque não sente a dor. É curável e só transmitida por contato prolongado com doentes.
Agora, Natália cuida de mulheres da colônia que, além da hanseníase, têm algum tipo de problema mental. Alojadas no pavilhão Santa Luísa, elas provocam ainda mais pena nos visitantes.
"Meu trabalho é mais de dar apoio, ver as necessidades delas, porque a minha saúde não permite muito esforço", diz a religiosa.
São 16 mulheres, com as quais conversa diariamente.

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