São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997
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Até nos EUA já se teme a recessão

CLÓVIS ROSSI
DO CONSELHO EDITORIAL

A crise internacional introduziu a amarga palavra recessão no vocabulário até dos consultores econômicos norte-americanos, embora os EUA vivam um dos períodos mais brilhantes do último quarto de século.
"Há uma chance em quatro de que a economia norte-americana deslize para a recessão", diz, por exemplo, Edward Yardeni, economista-chefe do Deutsche Morgan Grenfell, banco de investimentos.
Por enquanto, parece uma voz isolada, mas há virtual consenso entre os economistas de que a crise provocará queda no ritmo de crescimento da principal economia do mundo.
A grande maioria fala em redução de entre 0,25 e 0,5 ponto percentual no crescimento de 1998, anteriormente previsto para ficar em 2,5%.
Mas Philip Braverman, economista-chefe da financeira DKB, é mais pessimista: imagina que o PIB (Produto Interno Bruto, medida da riqueza de um país) crescerá a metade do anteriormente previsto, uma redução, portanto, de 1,25 ponto percentual.
Mesmo as vozes otimistas por dever de ofício, como a de Allan Greenspan, presidente do Fed (o banco central dos EUA), introduzem uma palavra de cautela.
Em depoimento na quinta-feira ao Congresso, Greenspan previu que a convulsão nos mercados asiáticos teria efeito "modesto" sobre a economia dos EUA.
Mas admitiu que não se trata de uma consequência "negligenciável", em especial pela perspectiva de que as exportações norte-americanas se vejam afetadas.
Serão, aliás, duplamente afetadas: a desvalorização de boa parte das moedas asiáticas torna mais competitivas as exportações daquela região na comparação com as dos EUA. E a desaceleração econômica reduz a demanda, inclusive de produtos importados.
O rabo e o cão
É claramente uma situação em que "o rabo começa a abanar o cachorro", compara David Whyss, economista-chefe da Standard & Poor's, corporação que avalia riscos do sistema financeiro.
O cachorro, no caso, é a supereconomia americana, que está sendo abanada pelo rabo (as economias, comparativamente bem menores, do Sudeste Asiático).
Mas outro "rabo" ameaça o cachorro: a América Latina.
"A maior parte do crescimento de nossas exportações vinha da América Latina, motivo pelo qual não víamos motivos para inquietação. Agora, de repente, a crise atinge também a América Latina", lamenta-se David Risler, economista-chefe da empresa Nomura International.
Tem razão: as exportações dos EUA para a América Latina cresceram 14,5% em 96, na comparação com 95, "uma taxa de crescimento que mais do que duplica o crescimento das exportações norte-americanas para o resto do mundo", diz Jeffrey Lang, subchefe do USTr, o organismo que cuida do comércio internacional dos EUA.
O problema é que, por mais que o rabo balance um pouco o cachorro, o inverso continua sendo mais poderoso: se o cachorro reduzir seu ritmo de crescimento, os rabos (Ásia e América Latina) terão dificuldades ainda maiores do que as que surgirão inevitavelmente como consequência das medidas para enfrentar a crise.
Os juros catapultados à lua, como ocorreu, por exemplo, no Brasil e em Hong Kong, reduzirão a atividade econômica. No Brasil, o que o governo chama de "hipótese de trabalho" é um crescimento, em 98, de apenas 2%, contra os 4% originalmente previstos.
É óbvio que, se o dinamismo da economia norte-americana for quebrado pela crise global, essa previsão se torna até otimista.

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