São Paulo, domingo, 16 de novembro de 1997
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Buraco negro confirma uma das hipóteses da relatividade

Estudo demonstra que rotação dos corpos "arrasta" o espaço

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Pesquisadores usando um satélite científico observaram buracos negros que, além de sugar a matéria de estrelas próximas, arrastavam o próprio espaço e o tempo ao seu redor, fazendo-os rebolar como bambolês.
A observação veio a confirmar uma previsão feita em 1918, com base na teoria da relatividade de Albert Einstein, sobre esse chamado "arrastamento do sistema de referência".
Buracos negros são regiões no espaço que surgem do colapso gravitacional de estrelas. Nem a luz nem a matéria podem escapar deles, que agem como se fossem gigantescos ralos cósmicos.
Distorção de órbita
O arrastamento, observado pela primeira vez, foi detectado indiretamente pela distorção da órbita de um gás emissor de raios X.
A pesquisa foi feita por Wei Cui, do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), Wan Chen, do Centro Espacial Goddard da Nasa (Administração Nacional de Aeronáutica e Espaço, dos EUA), e Shuang N. Zhang, do Centro Espacial Marshall, também da Nasa.
Os buracos negros sugam matéria de estrelas, e uma espécie de disco se forma em torno deles. O gás nesse disco, submetido a fortes pressões e altas temperaturas, emite radiações de vários tipos, notadamente na forma de raios X.
Os pesquisadores usaram o satélite Rossi, da Nasa, lançado em 1995 para o estudo de emissões de raios X cósmicos. Eles notaram uma variação repetitiva na intensidade de emissão desses raios.
Esse padrão repetitivo se explica pelo arrastamento do espaço -e do disco de gás- ao redor do buraco negro. O arrastamento do sistema de referência foi previsto pelos físicos austríacos Joseph Lense e Hans Thirring em 1918.
O espaço-tempo
Dados preliminares sobre o arrastamento haviam sido notados em torno de outros objetos astronômicos, as estrelas de nêutrons, pelos pesquisadores italianos Luigi Stella, do Observatório Astronômico de Roma, e Mario Vietri, da Universidade de Roma 3.
Os italianos também usaram dados coletados pelo Rossi (cujo nome é uma homenagem a um pesquisador do MIT pioneiro na área, Bruno B. Rossi).
Os resultados de agora dão ainda mais validade à teoria de Einstein, que já foi comprovada experimentalmente antes de outras formas.
O Universo explicado pela teoria da relatividade de Einstein escapa das sensações percebidas pelo ser humano no seu cotidiano.
Nem o tempo é absoluto e uniforme, nem o espaço é tridimensional e linear como as pessoas notam no seu dia-a-dia. E o que existe de fato é um híbrido, o espaço-tempo curvo. O tempo é uma dimensão extra do espaço.
A força da gravidade é o que causa a curvatura no espaço-tempo. O fenômeno só pode ser percebido em escalas gigantescas, cosmológicas, e com corpos de grande densidade, como os buracos negros e as estrelas de nêutrons.
A teoria da relatividade foi enunciada por Einstein em dois momentos. O primeiro foi o da teoria da relatividade restrita ou especial, em 1905. E em 1915 ele complementou a grande revolução científica que iniciara, propondo a teoria da relatividade geral.
Sistemas de referência
Na sua versão restrita, ele postulou o princípio da constância da velocidade da luz e o princípio da "relatividade", isto é, que as leis físicas são as mesmas em todos os "sistemas de referência inerciais". Este princípio implica que não existem movimentos absolutos; eles são sempre relativos.
"Sistemas de referência inerciais" são aqueles nos quais vale o princípio da inércia, segundo o qual todos os objetos no Universo tendem a manter seu estado de repouso ou de movimento.
Em outras palavras, se um corpo está em repouso ou em movimento retilíneo uniforme (isto é, tem direção, sentido e velocidade constantes), só uma força aplicada por outro corpo poderá tirá-lo dessa condição.
Na relatividade restrita, massa e energia são intercambiáveis, o que está enunciado na equação E = mc2, a mais elegante das que foram criadas por Einstein. Essa fórmula representa matematicamente que a energia (E) é igual à massa (m) multiplicada pelo quadrado da velocidade da luz (c).
Já na relatividade geral, objetos em movimento criam uma força adicional à força da gravidade, assim como elétrons em movimento criam um campo magnético adicional. Essa força adicional e a curvatura do espaço-tempo aceleram os sistemas referenciais, que deixam de ser inerciais.
Desvio da luz
Uma das maneiras para testar a validade da relatividade geral como teoria da gravitação é verificar o desvio que a luz sofre perto de um corpo de grandes dimensões.
A luz, enviada por uma estrela que no céu aparece como próxima do Sol, é desviada ao passar perto dele. É possível verificar isso quando há um eclipse solar, em que a Lua cobre a luz do Sol e facilita medir a posição das estrelas no céu.
Para checar esse desvio foram feitas duas observações em 1919 -uma delas no Brasil, no Ceará. Foi a primeira comprovação da relatividade geral.

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