São Paulo, domingo, 7 de dezembro de 1997
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MUNDO-CÃO MILIONÁRIO

DANIEL CASTRO
EDITOR-INTERINO DO TV FOLHA

Em 1983, para complementar a renda de um salário mínimo e meio, ele vendia espetinho de carne de segunda na rodoviária de Curitiba. Neste mês, deve ganhar cerca de R$ 260 mil. Desde a última segunda-feira, como se fosse um jogador internacional de futebol, tem seu passe fixado em R$ 25 milhões pela Record.
Filho de pedreiro, o ex-trabalhador rural, ex-palhaço e ex-lavador de defuntos Carlos Massa, 41, o Ratinho, viu seu salário ser multiplicado 37 vezes em apenas quatro meses.
Em julho deste ano, ele recebeu R$ 7.000 de salário da CNT/Gazeta, onde apresentava em rede nacional -desde junho de 96- o programa policial "190 Urgente", que o lançou para a fama.
O grande salto salarial aconteceu em setembro. Ratinho rompeu um contrato de dois anos com a rede paranaense, onde já estava ganhando R$ 30 mil, e foi trabalhar na Record, em São Paulo. Recebeu R$ 1 milhão de luvas da nova emissora, pagou R$ 600 mil à CNT e comprou um barco de US$ 20 mil e um jet ski.
Na Record, seu salário fixo dobrou para R$ 60 mil. Em novembro, ele faturou ainda cerca de R$ 70 mil com merchandising e R$ 75 mil de comissão pelos sorteios do sistema telefônico 0900 -foram 624 mil ligações no mês.
No último dia 27, o empresário Silvio Santos, ajudou o apresentador a dar novo salto em suas finanças.
Na tentativa de impedir que Ratinho estreasse hoje seu programa dominical na Record, o SBT teria lhe oferecido um salário de R$ 180 mil, mais uma previsão de 120 mil de comissão por sorteios. O SBT não confirmou nem desmentiu a informação.
Executivos da Record (incluindo bispos da Igreja Universal do Reino de Deus) convenceram Ratinho de que, fazendo as contas, ele poderia ganhar mais onde já está. "Mas eu não fui para o SBT para não parecer que sou mercenário", alega.
Na última segunda-feira, Ratinho assinou um aditamento ao seu contrato na Record: o apresentador fica na emissora até 2002 (antes era até 2001) e a multa pela rescisão de contrato -até então de R$ 11,6 milhões- subiu para R$ 25 milhões, segundo Eduardo Lafon, diretor de programação e operações da Record.
A emissora ofereceu ainda R$ 3 milhões de adiantamento (espécie de empréstimo sem juros e sem correção), 5% de comissão nos sorteios (antes eram 4%) e investimento na construção de um parque aquático e em uma rede de lojas com a marca Ratinho.
Em 98, o apresentador -que é sócio de uma FM no Paraná, de uma agência de publicidade e de uma empresa de produtos para emagrecer- deve ampliar seu patrimônio com um circo -"só de palhaços, sem animais", diz- e com uma gravadora.
Em seus planos estaria também uma produtora de shows e eventos e até uma loteria popular -o que ele nega.
Assédio
O novo "rei da cocada preta" da TV brasileira diz que já foi sondado até pela Rede Globo, que teria interesse em fazer um programa policial. Recebeu propostas também das rádios Globo, Capital e Record, de São Paulo, mas as recusou. "Tenho problemas na garganta e fico rouco com muita facilidade", justifica.
Tanto assédio também se justifica. O "Ratinho Livre", espécie de circo de horrores que ele apresenta diariamente, das 20h30 às 22h na Record, tem obtido picos de até 16 pontos de audiência -o equivalente a 1,28 milhão de telespectadores na Grande SP.
Com as atrações bizarras do "Ratinho Livre", a Record triplicou sua audiência no horário -de 3 para 9 pontos de média no Ibope. A emissora dobrou o número de inserções publicitárias e aumentou o preço do anúncio de 30 segundos de R$ 5.048 (em agosto) para R$ 8.104.
Homem simples
Mesmo com o sucesso, Ratinho se diz um homem simples, do tipo que come salada com as mãos. "Eu não sou mão de vaca. Só não sei jantar no Fasano (restaurante nos Jardins, em São Paulo)", diz ele, que, na última terça à noite, recebeu a Folha em seu apartamento vestindo apenas uma cueca samba-canção.
Ratinho nasceu na zona rural de Águas de Lindóia, divisa de São Paulo com Minas Gerais, e tem três irmãos. Aos 6 anos, sua família mudou-se para Jandaia do Sul, no norte do Paraná.
"Nunca tive carteira de trabalho assinada. Trabalhei na roça, colhendo café, dos 9 aos 12 anos, e nos finais de semana engraxava sapatos. Sempre fiz picaretagens, rolo com carro, vaca, égua...", conta.
Na adolescência, Ratinho -que conquistou esse apelido por ser "raquítico"- montou um grupo de teatro e também excursionou em circos. Ele só estudou até o 2º ano do colegial técnico em contabilidade.
Mas foi graças à popularidade que conquistou trabalhando em feira livre que ele conseguiu se eleger vereador em Jandaia do Sul, pela primeira vez, aos 19 anos.
Em 82, foi reeleito, mas abandonou o mandato um ano depois. "Na época, já estava casado com a Solange (Martinez Massa, 39, sua mulher), fiquei desempregado e o salário da Câmara não dava pra nada. Eu queria trabalhar no rádio e fui para Curitiba."
"No começo, foi difícil. Trabalhei como office-boy do secretário estadual de cultura e vendi espetinhos na rodoviária", lembra.
Em 84, junto com o radialista José Augusto Canário, Ratinho iniciava no rádio uma carreira que alternaria jornalismo de mundo-cão e política. O programa com Canário fez sucesso e, em quatro meses, virou líder de audiência.
Dois anos depois, Ratinho estreou como repórter policial do programa "Cadeia", célula do "190 Urgente", do qual ele passaria a ser apresentador em novembro de 94.
Em 88, graças à TV, Ratinho se elegeu vereador em Curitiba, pelo PMDB. Em 90, com cerca de 40 mil votos, conquistou uma vaga na Câmara dos Deputados pelo então PRN de Fernando Collor de Mello. Já no PTB, em 92, votou a favor do impeachment de Collor.
Hoje, se diz decepcionado com a política. "Foi a pior experiência da minha vida. Vereador ainda consegue alguma coisa com o prefeito, mas deputado não manda nada, é medíocre. Nunca mais serei candidato a nada", discursa.
No Congresso, Ratinho foi coadjuvante na defesa de questões como o imposto único e participação dos empregados nos lucros.
"Sempre fui meio de centro-esquerda", diz. Uma definição um tanto exótica para quem é católico carismático, favorável à pena de morte e que acha o homossexualismo uma doença -apesar de afirmar que "esses meninos efeminados não fazem mal".
O agressivo Ratinho, que atrás das câmeras é uma pessoa de fala mansa, também se revela "frágil". "Morro de medo de escuro. Não durmo sozinho numa casa nem amarrado."

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