São Paulo, quinta-feira, 11 de dezembro de 1997
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Desemprego e juros

PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

Nas últimas semanas, começaram a se fazer sentir mais claramente os efeitos da crise financeira sobre o mercado de trabalho. Como se podia prever, o desemprego está aumentando. Empresas demitem ou ameaçam demitir. Cresce a insegurança dos trabalhadores, que se vêem confrontados com a queda dos seus rendimentos ou a perda do emprego.
O que está acontecendo é apenas o início de um ajuste programado. Em nome da recuperação do equilíbrio externo, o governo resolveu sacrificar o equilíbrio interno da economia, inclusive o nível de emprego e o salário real.
Tudo indica que os próximos meses serão muito difíceis. O início do ano é um período em que a atividade econômica tende a se desaquecer naturalmente. Em 98, teremos ainda o impacto das medidas emergenciais adotadas desde fins de outubro.
Embora a mídia tenha dado mais destaque ao pacote fiscal, a decisão mais significativa foi a alta brutal das taxas de juro no final de outubro. Desde então, o Banco Central diminuiu um pouco a taxa básica de juro. Mas o Brasil continua a ser -e por larga distância- o país que aplica as taxas de juros reais mais altas do mundo. Em termos internacionais, os juros brasileiros constituem uma aberração. É o que mostra a atualização de levantamento referente a 40 países desenvolvidos e em desenvolvimento. A tabela apresenta os juros praticados nos chamados "mercados emergentes".
Os dados referem-se às taxas de curto prazo no início deste mês, deflacionadas por índices de preços ao consumidor. A taxa real no Brasil é de 35% ao ano. Nos outros 24 "mercados emergentes", a taxa é de 5,2% ao ano, em média. Nos seis "mercados emergentes" do leste da Ásia, que estão no olho do furacão, a taxa média é de 10%.
Além do Brasil, apenas cinco outros países -a Indonésia, a Coréia do Sul, a Rússia, a Tailândia e a Polônia- praticam juros reais de 10% ao ano ou mais. Só a Indonésia se aproxima da marca de 20%.
Não se deve perder de vista, além disso, que esses dados dizem respeito aos juros básicos de curto prazo. De forma geral, as pessoas físicas e as empresas brasileiras, sobretudo as de menor porte, pagam taxas muito mais altas quando recorrem a crédito bancário em reais. Por exemplo, pequenas e médias empresas estão pagando taxas de até 101% ao ano para desconto de duplicata e de até 77% para financiamento de capital de giro por 30 dias, segundo dados publicados na "Gazeta Mercantil".
Essas taxas de juro astronômicas, aliadas ao pacote fiscal e ao desaquecimento sazonal do início do ano, vão sufocar o nível de atividade e de emprego na economia brasileira nos próximos meses.
Os níveis de desemprego e o subemprego já eram preocupantes, mesmo antes da crise iniciada em fins de outubro. As taxas de desemprego aberto, tal como calculadas pelo IBGE e outros órgãos, não refletem esses problemas em toda a sua extensão. Medidas mais amplas, que procuram captar o emprego precário ou irregular, dão uma idéia mais adequada.
Na Grande São Paulo, os dados de outubro, levantados pela Fundação Seade e pelo Dieese, já apontavam para uma taxa recorde de desemprego, de 16,5%. Levantamentos semelhantes, realizados em outras regiões metropolitanas -Distrito Federal, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e Salvador- também já mostravam taxas bastante elevadas de desemprego e subemprego nos meses recentes, variando entre um mínimo de 13,1% em Porto Alegre e um máximo de 22% em Salvador.
O próprio IBGE calcula um conceito mais amplo de desemprego, que inclui ocupados sem rendimento e ocupados com rendimento inferior a um salário mínimo. Por esse critério, a taxa de desemprego nas seis principais regiões metropolitanas foi de 13,8% em outubro, variando entre 9,8% no Rio de Janeiro e 22,2% em Salvador.
Todos esses dados são anteriores à crise recente e às medidas de arrocho fiscal e monetário adotadas pelo governo brasileiro. Nos próximos meses, teremos provavelmente aumentos substanciais dessas taxas de desemprego.
Mais do que nunca, é necessário modificar em profundidade a política macroeconômica, de forma a reduzir a vulnerabilidade do país, diminuir as taxas de juro e proteger o nível de emprego. O modelo seguido nos últimos anos dá sinais evidentes de esgotamento.
O mínimo que se pode esperar do governo é que adote, sem demora, políticas de caráter compensatório para aliviar o sofrimento produzido por suas medidas fiscais e monetárias recentes.
Ou são só os bancos, os investidores e os mercados financeiros que merecem socorro em momento de emergência?

E-mail pnbjr@ibm.net

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