São Paulo, quinta-feira, 18 de dezembro de 1997
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Grátis ou gratuito?

Grátis ou gratuito?
PASQUALE CIPRO NETO
Colunista da Folha

PASQUALE CIPRO NETO
COLUNISTA DA FOLHA

Grátis ou gratuito? Cartazes e placas se encarregam de aumentar a confusão. Numa mesma loja, vêem-se dois anúncios. No primeiro, "Colocação grátis". No segundo, "Colocação gratuita".
Grátis é advérbio e, por isso, deve modificar basicamente verbos. Grátis corresponde a "gratuitamente, de graça".
Portanto basta pensar que, se for possível usar de graça ou gratuitamente, será possível usar grátis: Estacione gratuitamente/Estacione de graça/Estacione grátis.
Se não for possível essa substituição, use gratuito (ou gratuita): Estacionamento gratuito/A entrada é gratuita.
Não é difícil perceber que gratuito é adjetivo e deve modificar substantivos.
Em língua existe um fenômeno chamado contaminação, transferência. O que é isso? Quase sempre por semelhança, as pessoas são levadas a empregar indevidamente determinadas expressões. É esse o caso de grátis e gratuito, semelhantes na forma e no significado, mas diferentes no papel gramatical.
Vamos repetir: para modificar verbos, use grátis (Viaje grátis/Faça grátis a regulagem dos faróis/Tome grátis um café/Receba grátis um folheto ilustrativo). Em todos esses casos é possível trocar grátis por gratuitamente, de graça.
Para modificar substantivos, use gratuito, gratuita: passagem gratuita/serviço gratuito/viagem gratuita.
Se você procurar grátis no Aurélio, tome cuidado. Por um cochilo de revisão, o dicionário registra grátis como adjetivo, mas dá o significado correto: "de graça".
Algumas empresas exageram e anunciam: "Ganhe grátis um relógio". Ganhar grátis ou gratuitamente é mais do que redundante.
Outro erro muito comum diz respeito à pronúncia da palavra gratuito. A tonicidade deve cair na letra u, e não na letra i. Leia gratúito, e não gratuíto. É claro que coloquei o acento só para você perceber onde está a vogal tônica.
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A história do "a nível de" continua rendendo. Em Londres, o presidente da República brindou a língua portuguesa com a seguinte pérola: "Mas essa dificuldade é muito mais sentida a nível dos indicadores e a nível dos especialistas do que a nível da população".
Imagino que o presidente estivesse tentando dizer que para a população o efeito dessa dificuldade é mais leve do que os indicadores e os especialistas apontam.
O jornalista Clóvis Rossi, um mestre, mencionou isso em sua coluna de 6 de dezembro, concluindo, irônico: "A nível de FHC, ontem não foi um bom dia".
Alguns leitores não entenderam a ironia e escreveram, reclamando da incoerência do jornalista. Sem comentário.
É bom não levar a coisa a ferro e fogo. No caso de "o governo de FHC reduziu a inflação a níveis civilizados", a história é outra. Não se trata de uma daquelas situações bizarras, em que a famigerada expressão não significa nada. É só ler com atenção para perceber que a história é outra.
Outra chatice do tecnoburocratês é a intragável "patamar", que muitos economistas adorariam usar nesse caso ("reduziu a inflação a patamares civilizados"). Socorro!

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