São Paulo, domingo, 21 de dezembro de 1997
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O fim dos Estados

LUÍS NASSIF

Trava-se hoje, na região metropolitana de Campinas, uma batalha que, se vitoriosa, mudará o panorama da administração pública brasileira. Dezenove municípios da região metropolitana, com prefeitos de diferentes partidos, uniram-se para a criação de uma agência que será incumbida de planejar o desenvolvimento e aplicar tecnicamente os recursos públicos da região.
Bem-sucedido, a médio prazo esse modelo mudará o perfil do federalismo brasileiro. Não mais será sonho imaginar o país dividido em municípios, regiões homogêneas e União, acabando com a figura dos Estados.
Caberá a essa agência definir as prioridades da região, receber as verbas estaduais e federais, de maneira automática, e aplicá-las na região, de forma técnica. O poder será compartilhado, submetendo todas as decisões a critérios técnicos. Sua atuação continuará submetida aos poderes estaduais, mas, graças ao compartilhamento de decisões, sem as interferências da mediação política.
Ficção dos Estados
Uma visão mais crítica demonstrará que os Estados são quase ficções administrativas. À União cabe funções claras, de defesa da Nação, diplomacia, políticas sociais compensatórias etc. Aos municípios, a implementação de serviços diretamente ligados aos cidadãos. E aos Estados? Teoricamente, caberia a eles estabelecer políticas unificadoras, dentre os municípios que compõem sua base administrativa.
Ocorre que a maior parte dos Estados não é constituída de regiões homogêneas. São Paulo tem a região metropolitana de Campinas e o Vale do Ribeira. Pior: o sistema de decisões é anacrônico. Numa ponta, o Executivo decidindo centralmente sobre áreas cada vez mais complexas. Na outra, as assembléias legislativas, impondo barganhas políticas pesadas, que comprometem substancialmente a racionalidade na alocação de recursos públicos.
Tentativas paulistas
No início da gestão Covas, decidiu-se implantar a primeira região metropolizada em Santos, em nove municípios da Baixada. O projeto acabou sendo preparado pelo Executivo, ainda eivado de vícios do velho centralismo.
A região ficou sob domínio absoluto do governo do Estado. A lei complementar nº 14 definiu um conselho deliberativo composto por 5 elementos, 3 nomeados pelo governador, 1 pelo prefeito da capital e 1 representando o conjunto dos demais municípios. Abaixo dele, um conselho consultivo, formado pelos prefeitos da região.
A implementação está a cargo da Secretaria do Planejamento, mas o modelo ainda não saiu do papel. Em parte, porque a Seplan ainda não implementou nada. Em parte, porque os prefeitos não se interessaram por este modelo.
Reação federativa
A reação federativa começou em Campinas.
O modelo, em torno do qual se uniram os 19 prefeitos, consiste na criação de quatro figuras básicas. A primeira, um conselho deliberativo, representado pelos 19 prefeitos dos municípios envolvidos, mais 19 representantes do governo do Estado.
É evidente que, nessa composição, o governo do Estado não terá dificuldades em obter maioria. Mas todas as decisões terão de ser colegiadas, eliminando a mediação política. E a implementação das obras ficará a cargo da própria autarquia, ao contrário do modelo de Santos, onde a execução ficará a cargo de secretarias estaduais.
Abaixo do conselho haverá uma diretoria executiva, tocada por um profissional nomeado pelo governador. Fiscalizando as ações, um conselho consultivo, formado por entidades representativas da região.
Finalmente, um fundo de desenvolvimento, formado por um percentual do ICMS, para financiar os projetos gerados no âmbito da autarquia.
Esse anteprojeto -preparado pela advogada Darci Fernandes Pimentel- deverá unificar três projetos de lei que já tramitam na Assembléia Legislativa. Dentre eles, o dos deputados petistas Renato Simões e José Pivato, que representa avanços significativos. Por ele, em vez de uma comissão paritária -prefeitos e Estado- haveria um modelo tripartite, agregando representantes da sociedade civil.
Autarquia municipal
A autarquia decidirá sobre as seguintes matérias de interesse comum dos municípios da região metropolitana:
1) planejamento e uso do solo; 2) transporte e sistema viário regional; 3) habitação; 4) saneamento básico; 5) meio ambiente; 6) desenvolvimento econômico; 7) desenvolvimento social.

E-mail: lnassif@uol.com.br

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