São Paulo, segunda-feira, 22 de dezembro de 1997
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Titãs acústico foi o pior de 1997

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
ESPECIAL PARA A FOLHA

Dilemas pseudo-existenciais, cabecismo, arranjos "profundos". Os piores defeitos que podem acometer uma banda de rock aparecem em doses cavalares num dos discos mais vendidos do ano, o acústico dos Titãs.
Os Titãs são uma banda de mentira, os herdeiros diretos da afetação e do conformismo, combustível desse monstro que domina a música brasileira, o establishment caetânico.
Já mudaram de estilo zilhões de vezes (curiosamente, sempre embarcando no que está na moda) e fazem pose séria, na melhor escola Herbert Vianna de pretensão.
As vendas altas do último disco só não representam um desastre completo para o pop nacional porque também está nas paradas um CD de primeira, "Sobrevivendo no Inferno", dos Racionais MC's. Noves fora, mediocridade versus brilho, fica tudo zero a zero.
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E já que o assunto é o que houve de pior e mais falso em 1997, temos de citar o pacotão Caetano Veloso, com disco e livro. Caetano transformou-se exatamente naquilo que ele e a tropicália combateram: representante-mor da ordem estabelecida, hegemônica.
Afogado em maneirismos, virou caricatura de si próprio e conseguiu, com seu novo CD, desagradar até fãs de carteirinha.
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Em 97, o tradicional exército de impostores que todo ano se renova na MPB ganhou novos nomes. Lançaram discos figuras como Lenine, Daúde e uma série de outros "gênios" que prometem renovar a música brasileira, mas serão despachados de volta ao anonimato em menos de seis meses.
Na linha "eu me levo a sério", Chico César continuando fazendo pose de sério/sofrido, gastando todos os clichês do circuito cabeça paulistano. É de uma desimportância abissal, feito sob medida para quem gosta de Sade Adu, jazz e Jamiroquai.
É o mesmo tipo de gente que vê arte visionária em Fernanda Abreu, Carlinhos Brow e outros experimentadores de araque. Um caso de merecimento mútuo.
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No ano que que termina, lemos de novo, em vários lugares, que "o Brasil entrou definitivamente no circuito dos grandes shows internacionais". Conversa para boi dormir, claro. Estamos até agora esperando Frank Black, Sonic Youth, Pavement, Prodigy e dezenas de outros concertos que haviam sido prometidos este ano para o país.
Noventa e sete foi também o ano em que um show de Dick Dale, o inventor da surf guitar e figura lendária do rock, foi cancelado no Rio de Janeiro por falta de público. Só quatro idealistas compraram ingresso. Já o acústico do Herbert Vianna estava lotado.
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O Brasil também se consolidou como uma espécie de museu gigantesco do heavy metal e do hardcore, com as presenças patéticas nos palcos daqui de Whitesnake, Scorpions, Suicidal Tendencies e outros cadáveres insepultos.
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O conforto e os preços das casas de shows brasileiras se mantiveram entre os piores do mundo. O calor é quase sempre insuportável e vende-se a R$ 2,50 a mesma latinha de cerveja que no supermercado custa 50 centavos. Suicidal Tendencies tocou no Palace a R$ 25, valor do ingresso para um festival grande, como o Lollapalooza, nos EUA.
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No mundo, os idosos Rolling Stones insistem em grandes turnês, despedaçando a respeitabilidade que ganharam ao longo dos anos com seus discos essenciais. Como dizia Pelé, é preciso saber a hora de parar. Jagger, Richards e companhia não aprenderam a lição.

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