São Paulo, domingo, 28 de dezembro de 1997
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O ano global

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
EDITOR DE DOMINGO

Talvez como nenhum outro, 1997 pode ser descrito como o ano da globalização. Dois fatos deixaram às claras, nos últimos 12 meses, a mudança de patamar em curso na atual fase de internacionalização: a megavideomorte da princesa Diana e o crash das Bolsas.
No acidente de Diana, a mídia também foi protagonista. Começou como vilã, mas acabou, afinal, faturando com a surpreendente reação popular britânica e internacional.
Um jornalista do "Independent" disse numa palestra aos jornalistas da Folha que jamais a Inglaterra assistira a uma reação daquelas. Foi um fato novo na história do recato saxão.
Mas não só no Reino a turba foi às ruas expressar sentimentos. Do Alaska à Patagônia, de Tóquio a Berlim, Diana catalisou as atenções, levando jornais, revistas e TVs a uma massacrante maratona, frequentemente hipócrita e melodramática, mas que deixou, afinal, alguma reflexão.
Jornalistas velha-guarda pensam que tudo foi uma enorme bobagem e que a imprensa de prestígio acabou sendo atraída pelo estilo paparazzi dos tablóides. Não acham Diana importante.
Não perceberam que ocorreu um fenômeno sociológico com dimensões globais. Diante da novidade, preferiram a velha ladainha: tudo é "manipulação" ou "invasão de privacidade". A mídia séria deveria estar preocupada com coisas mais "importantes" -como se a morte de uma pessoa que mobiliza multidões em todo o planeta não fosse importante. Como se não fosse importante perguntar por que isso aconteceu.
Se no caso Diana a globalização revelou-se na propagação planetária do sentimentalismo, pelos meios de comunicação, no caso do crash ela evidenciou-se na propagação do pânico e da especulação, pelos meios eletrônicos que movimentam on-line o megacapital financeiro mundial.
Pela primeira vez, o chamado cidadão comum pôde perceber como sua vida não depende mais do universo local. O mundo é ele mesmo, cada vez mais, o seu local. Um terremoto em Hong Kong provoca abalos em Nova York e São Paulo. Uma falência em Tóquio já não é mais um problema japonês.
Ainda que autoridades nacionais tenham reagido e conseguido, em alguns casos, afugentar a catástrofe de seus quintais, o crash deixou claro que a instância do Estado-Nação vai perdendo autonomia. Torna-se cada vez mais refém de um sistema que cruza fronteiras sem passaporte, podendo aniquilar um país num teclar de computador.

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