São Paulo, quarta-feira, 12 de fevereiro de 1997
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Supla cria "bossa furiosa" e faz sucesso

MARCELO RUBENS PAIVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Supla, 30, cantor, compositor, ator e camisa 9 "bichado" do Internacional (time da liga profissional de Nova York), resolve um dilema antigo -ser um brasileiro criado nos Estados Unidos-, inventando a "bossa furiosa".
O ritmo pode traduzido como uma "bossa nova hardcore". Com Marcelo Zargos, pianista brasileiro que também mora em Nova York, Supla fundou o projeto "Supla Z".
Gravaram uma demo com dez músicas; participam Bebel Gilberto (filha de João Gilberto), Mo Brasil e músicos que tocam com David Byrne, como Mauro Refosco.
As músicas mesclam ritmos pesados com suingue brasileiro. O berimbau está presente, assim como a narração de um gol de Clodoaldo (Supla é santista).
"Não vou assinar o primeiro contrato que aparecer. Desta vez, queremos uma relação profissional com uma gravadora. Desde o disco solo, já fisgava as idéias da bossa furiosa", diz.
Há três anos, ele se mudou para Nova York, onde montou a banda metalpunkcore Psycho 69.
Psycho lota três shows por semana na região e encontra admiradores como Iggy Pop e Ramones. Lançou em 96 o primeiro CD, "Psycho 69". Para não se expor em excesso, a banda não divulga mais os shows -apenas os frequentadores das casas ficam sabendo. Supla procurará conciliar a agenda lotada da banda com o projeto "Supla Z".
O dilema de Supla
Supla morou seis anos nos Estados Unidos, enquanto os pais, o senador Eduardo Suplicy e a deputada federal Marta Suplicy (ambos PT-SP), faziam pós-graduação em universidades norte-americanas.
Foi para lá bebê, aprendeu a falar inglês antes do português e tem em suas veias um sangue com tempero rock-e-baticumlelê.
No Brasil, sua carreira começou em 86. Gravou dois discos com o grupo Tokyo. Depois, um disco com a banda Supla e os Exibidos, e um outro, solo.
Supla decidiu sair do Brasil quando percebeu o quão estereotipada estava sua imagem.
O fato de ser filho de duas personalidades importantes do cenário político interferia em seu trabalho, já que lhe cobravam posições ideológicas semelhantes às dos pais.
"Tive de sair fora. Lá (nos EUA), eu sou apenas o Supla, que se fez sozinho. Me respeitam pelo que faço nos palcos", diz aliviado.
Se Supla saiu ganhando, com uma autonomia que não tinha no Brasil, o público norte-americano ganhou mais.
Suas letras tocam em feridas mal cicatrizadas, como os conflitos raciais aparentemente insolúveis. É um brasileiro que fala inglês correntemente e analisa, olhando de fora, os problemas norte-americanos -por essa e outras, sua banda é cultuada em Nova York.
Recentemente, compôs a música "When Cuba Will Be Free" (Quando Cuba será livre), mexendo em um vespeiro norte-americano. "Livre do quê? Pode ser do Fidel como dos EUA. Gosto dele, mas não de tudo que ele faz."
"Não precisei sair do Brasil para gostar de música brasileira, tanto que gravei 'Cotidiano', de Chico e Caetano, no meu disco solo."
A "Pshyco 69" tem um público variado, mas não se interessa por tocar músicas brasileiras.
"Minha banda tem uma filosofia de vida radical. Eles montam as próprias motos e não votam. Dizem que não adianta nada votar. Discordo deles", diz.
Supla colocava, após os shows da banda, músicas de Tom Jobim e João Gilberto. O público aprovou. "Tom Jobim dá um clima campeão. Eu pensava, é mais louco que tudo isso aqui."
Ele diz que a música que mais o influenciou é de Vinicius de Moraes, e canta "a coisa mais divina que há no mundo, é viver cada segundo como nunca mais..."
As "bossas furiosas" têm elementos dancing, tecnologia (compassos sampleados originalmente), percussão e um clima Copacabana anos 50. Algumas letras são em inglês e outras, em português.

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