São Paulo, terça-feira, 25 de fevereiro de 1997
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Mulher comanda na falida Paraíba

MÁRIO MAGALHÃES
ENVIADO ESPECIAL A JOÃO PESSOA

Quem entra na sede da Federação Paraibana de Futebol, em João Pessoa, vê logo na primeira sala uma folhinha, ainda de 1996, com uma foto de mulher, tirada há pelo menos dez anos. O calendário não mostra nenhuma modelo nua, como os que enfeitam borracharias, mas um rosto.
Na sala seguinte, onde a folhinha também está na parede, despacha a responsável pela encomenda de milhares delas para distribuição gratuita em todo o Estado, com o seu próprio retrato: Rosilene de Araújo Gomes, única mulher a presidir uma federação estadual no Brasil.
Aos 49 anos, ela comanda a entidade há oito, com pulso de ferro. Já foi reeleita duas vezes e fica, pelo menos, até 1999.
Na sua primeira eleição, em 1989, obteve 51 dos 54 votos e se envolveu numa briga que a deixou vários dias no hospital com hematomas no corpo. "Eu só fazia levar", lembra.
Um adversário também foi internado. Entre seus agressores, o ferido apontou filhos de Rosilene.
Ela se casou aos 14 anos e teve cinco filhos. Batizou um como Douglas (por causa do ator Kirk Douglas), outro como Tyrone (homenagem ao astro hollywoodiano Tyrone Power). Já é avó de dez crianças.
Satisfazendo o ego
Milionária, possui com o marido, o procurador do Estado Juracy Pedro Gomes, fazendas, fábricas (uma de material esportivo) e lojas (pelo menos uma de esportes).
Questionada sobre o que a atrai numa federação pobre, num Estado de futebol paupérrimo e no conflito permanente com clubes, Rosilene responde: "Sou formada em psicologia e filosofia. Sei que estou aqui para satisfazer o ego."
Sua carreira esportiva começou cedo, muito cedo. Em 1962, quando se casou, o marido presidia o Auto Esporte e ela o acompanhava em jogos pelo interior.
Dois anos depois, quando Juracy Gomes deixou a equipe da capital paraibana, foi convidado para dirigir o ABC, um clube amador.
Como não quis, ela aceitou a presidência, aos 16 anos. Em 1965, trocou o ABC pelo Filipéia e, em 1968, foi presidir o Atlético.
"Tenho amor ao esporte, não à cor da camisa. Não torço por clube algum. Já viu uma administradora dessas?"
Em 1970, ganhou o título de madrinha do esporte amador, se afastou do futebol e, durante dez anos, dedicou-se exclusivamente aos negócios da família.
Em 1980, o marido sucedeu o dirigente que dominava a federação havia 25 anos e inaugurou uma nova dinastia esportiva na Paraíba.
Ficou até 1986, quando deu lugar a um presidente indicado por um político local e, três anos mais tarde, patrocinou a candidatura de sua mulher.
Rosilene afirma que não queria dirigir a entidade. "Mas ouvi meu rival dizendo que se eu concorresse não seria páreo duro e que lugar de mulher é em casa, lavando prato. Então, resolvi vencer."
Sem baixaria
Na primeira reunião com clubes, ela estabeleceu uma nova norma: proibiu palavrões.
"Um presidente de clube quis falar mais alto. Bati na mesma, exigi respeito e os palavrões acabaram. Era impossível uma mulher participar da federação. Hoje, quem tiver que dizê-los, que o faça em casa ou na esquina."
Ao conversar por telefone com o presidente da Confederação Brasileira de Futebol, Ricardo Teixeira, ouviu sugestão para entregar uma procuração ao marido, que a representaria num encontro.
"E ele é o presidente?", perguntou, irritada, a Teixeira.
Uma vantagem do modo feminino de administrar, na opinião de Rosilene, é o constrangimento para lhe fazerem propostas escusas.
"Aqui não podem me chamar num cantinho para tramar coisas desonestas. Pegaria mal."
Vaidosa (vai duas vezes por semana ao cabeleireiro) e cuidadosa com o corpo (caminha, faz ginástica e recebe massagem todos os dias), ela odeia novelas.
O telão de 65 polegadas no seu quarto tem outro objetivo. "É para ver melhor o futebol, claro."

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