São Paulo, terça-feira, 25 de fevereiro de 1997
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Submissão ao atraso

SÍLVIO LANCELLOTTI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

No chamado mundo civilizado do futebol, a Europa, os clubes grandes têm muito mais privilégios do que os pequenos. Ostensiva razão: são eles, claro, que produzem dinheiro nos campeonatos.
E não existem rebeldias que revertam isso. Tomemos um exemplo recente, na Itália. Dois grupos de times menores decidiram se revoltar contra os maiores (Internazionale, a Juventus, o Milan e Roma) e apresentaram candidaturas próprias à presidência da Liga das agremiações.
Havia 38 votantes, os 18 clubes da Série A e os 20 da B. Num primeiro escrutínio, o favorito dos grandes, Franco Carraro, se limitou a quatro votos. Os diletos dos menores, Antonio Matarrese e Giuseppe Gazzoni Frascara, chegaram a 17 e a 16.
Bastaria uma aliança mínima dos pequenos para que Matarrese, ou Gazzoni, conseguisse a entronização, correto? Não. Erradíssimo.
Os grandes, embora em dramática inferioridade, resolveram montar um comitê paralelo, velada ameaça de cisão. Fiorentina, Lazio, Napoli e Parma logo perceberam o risco que correriam sem os maiores. No fim das contas, obviamente, Carraro levou a Liga com 36 dos sufrágios.
Por quê tanta disputa? Acontece que, na Europa, ao contrário do Brasil, as ligas dos clubes são, muitas vezes, mais importantes do que as federações. Cabe às federações a administração das seleções, a representação de seus países junto à Uefa e à Fifa. Cabe às ligas, porém, cuidar do dinheiro proveniente das loterias esportivas, da comercialização dos torneios, da venda dos direitos de transmissão por rádio e por TV.
Na próxima temporada, Carraro deverá administrar cerca de US$ 700 milhões. E nesse montante não se incluem as arrecadações dos jogos das séries A e B.
Na Europa, enfim, cabe às ligas cuidar do negócio efetivo do futebol. As federações se limitam à política e à diplomacia da modalidade.
Os tribunais de justiça e as comissões disciplinares são organismos das ligas, e não das federações.
Mesmo nos níveis superiores, os clubes detêm a última palavra. Foram as agremiações que impuseram à Uefa as recentes modificações nas copas interclubes do Velho Continente, com a criação da Liga dos Campeões.
Que benefícios recebem o Real Madrid ou o Manchester United ao enfrentarem os campeões da Albânia ou do Luxemburgo? Nenhum. Aliás, se arriscam em viagens deficitárias e em confrontos perigosos em campos carecas.
Um cotejo entre o Bayern e o Barcelona pode render em torno de US$ 3 milhões, só com os ingressos vendidos. Quanto se levantaria com um prélio entre o Omônia de Chipre e o Inkaras da Lituânia?
Os clubes perdem ao não se utilizarem da Lei Zico e ao ignorarem a possibilidade de transformar o Clube dos Treze numa liga. A sua submissão à CBF apenas atrasa o futebol.

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