São Paulo, sexta-feira, 7 de março de 1997
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Forman eleva editor a herói

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA
DE WASHINGTON

A história da luta pela liberdade de expressão nos Estados Unidos registra muito poucas situações tão contraditórias como a defesa que foi dada a Larry Flynt contra os que tentaram censurá-lo.
Por isso, é difícil, mesmo para o mais liberal dos críticos, aceitar de bom grado a valorização positiva que Milos Forman dá a Flynt em seu filme.
Talvez Milos Forman tenha sido tão condescendente por nunca, como ele mesmo admite, ter lido um exemplar da revista "Hustler", a obra-prima editorial de Flint.
Não é só que "Hustler" tenha sido sempre uma publicação de mau gosto. Gosto não se discute, afinal. Ela também foi e ainda é racista, sexista, violenta.
Claro que nada disso serve de justificativa para a imposição de censura. Mas tampouco é motivo para elevar o editor ao panteão dos grandes benfeitores da humanidade.
Ainda mais quando esse personagem não é também nenhum modelo de caráter em sua conduta pessoal.
Duas de suas filhas o acusam de tê-las molestado sexualmente quando eram pré-adolescentes. Uma de suas três ex-mulheres, de agressão física.
Conflito central
O episódio central do filme, o processo que o reverendo Jerry Falwell moveu contra Flynt, envolve o conflito entre duas figuras repugnantes.
O ultraconservador Falwell é tão racista, sexista e violento quanto a revista de Flynt.
A decisão da Suprema Corte para o caso, de que figuras públicas podem ser objeto de sátira jornalística, é corretíssima, e o cartum de que Jerry Falwell se queixava tinha a tradicional marca de vulgaridade de "Hustler", mas até podia ser considerada como de certa graça.
Todas as pessoas nos EUA que acreditam na necessidade imperiosa de defender a liberdade de pensamento cerraram fileiras em torno de Flynt em 1988.
Mas muito poucas acharam necessário elogiá-lo, que dirá santificá-lo.
Forman justifica sua escolha com o fato de que a primeira vítima da censura no nazismo (do qual seus pais foram vítimas) foi a pornografia e que o grau de liberdade numa sociedade é diretamente proporcional ao de tolerância com a ela.
É um bom argumento. Mas Forman poderia ter retratado Flynt de maneira mais justa.
(CELS)

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