São Paulo, sexta-feira, 7 de março de 1997
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Daft Punk lança boom da dance francesa

CAMILO ROCHA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Depois de Chemical Brothers e Prodigy chegou a vez do Daft Punk. Essa dupla francesa tem todas as armas para ser mais um talento da dance underground a estourar para um público maior, consolidando um pouco mais a dominação mundial da eletrônica em 1997.
O grupo também é ponta-de-lança de um boom de dance de qualidade vindo da França, um país que sempre costumou ser um zero à esquerda na música pop.
Daft Punk é formado por Thomas Bangalter, 21, e Guy-Manuel de Homem-Christo, 22.
Inicialmente apadrinhados por Chemical Brothers, eles construíram uma reputação impecável nas pistas underground do Brasil e do exterior com faixas como "Da Funk", "Alive" e "Rollin' & Scratchin".
Depois vieram os atordoantes shows ao vivo, em megaeventos europeus como o francês Transmusicales e o inglês Tribal Gathering.
Agora eles acabam de lançar seu álbum de estréia, "Homework", importado para venda no Brasil pela Virgin.
A subsidiária inglesa da gravadora contratou a banda no final do ano passado depois de uma acirrada disputa com vários outros pretendentes.
As 16 faixas do disco reinterpretam levadas funkeadas e sons disco para a era tecno, por meio de muita distorção, anarquia na equalização, samples dos anos 70 e linhas de baixo musculosas.
As raízes do Daft Punk estão tanto na dance como no rock. O pai de Bangalter compôs inúmeros hits nos tempos da disco, como "D.I.S.C.O.", interpretado por Ottowan.
Na adolescência, os dois parisienses tinham uma banda de rock, Darling. O grupo nunca foi para frente, mas pelo menos ajudou na origem do nome. Foi inspirado numa resenha que um jornalista escreveu metendo o pau na banda, classificando-os de "daft punk" ("punk idiota").
Daft Punk embarca nesta semana para os Estados Unidos, mais um lugar onde a Virgin está investindo pesado na banda. Às vésperas da viagem, Bangalter falou à Folha por telefone.
*
Folha - Por que chamaram seu disco de "Homework" (lição de casa)?
Thomas Bangalter - É uma brincadeira com o fato de termos gravado todo ele em casa. Nosso estúdio fica todo num quarto. Também é uma referência ao fato de esse disco, por ser o primeiro, ter sido um belo treino para nós, um exercício. Aprendemos muito gravando ele.
Folha - Quanto custou fazer esse disco?
Bangalter - Praticamente nada. Já tínhamos todo o equipamento, que fomos comprando com o dinheiro que ganhamos com os singles independentes que lançamos antes pela Soma (gravadora independente escocesa).
É uma prova de que não é preciso rios de dinheiro para fazer o disco que se quer.
Folha - É um disco exclusivamente para pistas ou dá para ouvir em casa?
Bangalter - Obviamente é direcionado para fazer as pessoas dançarem, mas sempre tivemos uma preocupação de fazer algo que pudesse ser ouvido em casa também.
Folha - O disco traz influências escancaradas de funk e disco dos anos 70. Você acha que muitos dos fãs mais novos de tecno e house ignoram essas raízes?
Bangalter - Pode ser que sim, mas a idéia não foi resgatar isso ou promover um revival. É que gostamos desses sons, gostamos do calor que esses grooves têm e queríamos trazer isso para o disco.
Folha - As dedicatórias de "respeito" do disco trazem vários nomes pouco comuns para um disco de dance, como Brian Wilson, dos Beach Boys, bandas psicodélicas como Love e Red Crayola e nomes como Black Crowes e Urge Overkill. Qual a importância do rock nas influências do Daft Punk?
Bangalter - Não é uma influência direta no som, são simplesmente bandas que gostamos de escutar. Quer dizer, todo tipo de música é importante para nós.
E por termos escutado tanta coisa ao longo de nossas vidas, de algum jeito tudo acaba tendo influência sobre o que fazemos.
Folha - Está havendo um "boom" de dance na França atualmente. Como você vê a cena francesa?
Bangalter - Está muito boa, crescendo cada vez mais. Há muitos bons produtores, músicos, muitos selos começando. A imprensa, tanto a francesa como a inglesa, está dando muito mais espaço para o que está acontecendo.
Mas, embora a produção musical tenha aumentado muito, isso não se refletiu tanto num crescimento do público. E isso é em boa parte por causa das autoridades que estão reprimindo a cena.
Folha - Como assim?
Bangalter - Estão pegando muito pesado. É uma coisa desproporcional. Houve uma festa em Bordeaux e mandaram a tropa de choque. Havia mais policiais do que frequentadores da festa.
O problema é que as autoridades misturam e generalizam tudo. Tecno, drogas, música do demônio, música repetitiva, é tudo um mal só a ser combatido.
E esses grandes ajuntamentos de jovens ouvindo esse tipo de música na boa é bem assustador para o "establishment". Eles não entendem o porquê desse comportamento.
Folha - Vocês se consideram um grupo underground com apelo "crossover", isto é, para vários tipos de público, assim como Underworld, Prodigy ou Chemical Brothers?
Bangalter - Nunca pensamos nisso. Não é nosso objetivo. Fazemos a música que gostamos e se outras pessoas gostarem, ótimo. Não acho que exista uma categoria "crossover" de música. Existem simplesmente discos que vendem muito mais que outros. Esses são "crossover".
Folha - Como aconteceu de Spike Jonze dirigir o vídeo para "Da Funk"?
Bangalter - Gostamos do trabalho dele, especialmente aquele vídeo dos Beastie Boys ("Sabotage").
Então o pessoal da Virgin que o conhece fez o contato e mandou uma fita com a música para ver se ele gostava. E aí aconteceu.
Folha - Os shows de vocês são elogiadíssimos pela imprensa estrangeira. Como vocês resolvem o velho problema de tornar música eletrônica tocada ao vivo interessante?
Bangalter - Levamos muito equipamento para o palco, muitas baterias eletrônicas e teclados. Nos esforçamos muito na execução dos sons ao vivo, em vez de nos concentrarmos numa performance no palco. As pessoas parecem gostar.
Folha - A imprensa daqui publicou que talvez vocês toquem no Brasil. É verdade?
Bangalter - Já se falou sobre essa possibilidade. Mas acho que será só para o final do ano.

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