São Paulo, sexta-feira, 7 de março de 1997 |
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Três receitas antigas para ter sucesso no amor
CARLOS HEITOR CONY
Apesar disso, a conversa naquela tarde não engatava. Em certos momentos, parecia que discutiam as Guerras Púnicas, o naufrágio do Titanic, o rapto das Sabinas -coisas antigas e impessoais, que nada tinham a ver com nenhum deles. O mais velho do grupo, aí pelos 40 e tantos anos, tinha a fama de ser ditoso entre as mulheres. A sua experiência era folclórica, decantada em todos os bares do Leme à Barra da Tijuca. Diziam que comera artistas americanas que aqui vinham pelo Carnaval. Diziam também que vivia com duas mulheres sob o mesmo teto e sobre a mesma cama. Diziam muitas outras coisas, algumas verdadeiras, outras lendárias -ele não desmentia nenhuma, o máximo de discrição de que era capaz se resumia em ficar mudo, mudez tática que confirmava a verdade e aumentava o mito. Nos últimos tempos, ele andava deprimido com a fama que alcançara e que nunca desmentira. Daí que, em vez de falar sobre determinado caso, sobre certa mulher, preferiu dar aquilo que os outros consideravam uma "aula". Subordinada ao tema: a melhor maneira não de levar uma mulher para a cama -o que seria uma inutilidade, todos ali acreditavam que eram sábios na matéria-, mas de fazer uma mulher apaixonar-se. Começou como o Roberto Campos quando explica alguma tese: dividiu o assunto em três pontos. O primeiro era a conquista direta. O segundo, a abordagem indireta. O terceiro seria um mix das duas anteriores, nem direta, nem indireta, mas razoavelmente oblíqua. A direta, segundo ele, estava na moda. É considerada a mais decente e eficaz. Para usar uma palavra muito utilizada por FHC, é transparente. O cara chega e diz à mulher cobiçada que está a fim e o mais prático é irem logo para a cama, perder tempo não é preciso. Tudo fica na base do clique, do "pintou um clima" -senha que, não faz muito, levou um coronel casado e pai de dois filhos à prisão, porque, justo quando ele estava no carro com um rapaz ao lado, o tal clima pintou. O modo indireto é mais complicado, requer uma técnica complicadíssima. O sujeito se aproxima da mulher como quem não quer nada, como se fosse perguntar onde fica a rua Barata Ribeiro, ou como se faz para pegar o túnel Rebouças. Não tem pressa nem desejo específico daquela mulher. Se pintar o referido clima, muito bem. Se não pintar, ele fica sabendo onde é a rua Barata Ribeiro e conhecendo o melhor caminho para pegar o Rebouças. Já é um lucro. O terceiro, em sendo uma combinação dos modos precedentes, alia a abordagem do apache ao distanciamento brechtiano. De qualquer forma, o candidato precisa ter uma bússola interior que lhe aponte a direção certa, o alvo correto. Para isso, é preciso experiência, audácia e, evidentemente, sorte. Aproxima-se da vítima, segura-a pelo braço e a arrasta a algum canto. Depois pede desculpas, diz que foi uma emergência, estava numa pior, fugindo de uma louca que cismara com ele. Um fim de caso, cheio de cobranças e equívocos, ele já não sabia mais o que fazer, temia até mesmo levar um tiro, a outra era louca, desatinada, já cortara os pulsos (dela) e ameaçara cortar o pescoço (dele) com um desses canivetes suíços que têm 1.001 utilidades. Bem, a vítima acredita naquelas desgraças, ou porque já vivera experiências parecidas, ou porque tinha informações a respeito. Sabia do que eram capazes as mulheres quando cismam com um cara. Para compensar o susto, topa um drinque ou uma pizza e tem início aquilo que Humphrey Bogart e Claude Rains se prometem ao final de "Casablanca": o início de uma boa amizade. Há que atentar para um detalhe: o cara que se arrisca a esse terceiro modo precisa ter, disponível, uma ou duas mulheres atrás dele e mais ou menos na situação descrita. Daí que, ao final do encontro, a vítima se oferece para ajudar. Promete procurar a desvairada, dá-lhe os conselhos circunstanciais, coloca-se à disposição dela para fazer programas que a façam esquecer aquele homem. E tudo corre bem até que, um dia (ou uma noite), intempestivamente, ela é procurada por uma desconhecida que lhe diz, com as mesmas palavras e a mesma oportunidade, tudo o que ela dissera à outra. Texto Anterior: CLIPE Próximo Texto: Erico Verissimo terá museu no RS Índice |
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