São Paulo, sexta-feira, 14 de março de 1997 |
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Aids avança, mas não assusta periferia
AURELIANO BIANCARELLI
Onze mil casos de Aids em mulheres foram notificados no Estado de São Paulo e 60% delas já morreram desde o início da epidemia, em 1980. A relação oficial de três homens doentes para cada mulher já está próxima de um empate nas regiões mais pobres da capital. O apelo para uma ação "urgente e eficaz" do Estado é feito por Nair Brito, educadora e presidente da Rede Paulista de Mulheres Soropositivas. Nair é também portadora do vírus. Ela é membro do GIV -grupo de auto-ajuda que há anos trabalha com mulheres das periferias do Rio e São Paulo. Segundo estudos da Secretaria da Saúde e do Pró-Aim, da Prefeitura de São Paulo, é entre as mulheres pobres e menos escolarizadas que o número de infecções e de mortes por Aids vem crescendo mais. Entre 94 e 96, a mortalidade nesse grupo aumentou 50,3% na cidade de São Paulo. O Ministério da Saúde e a secretaria da Saúde têm há mais de dois anos planos e estratégias direcionadas para essas mulheres. "Mas essas estratégias não estão dando resultados", diz Nair. O trabalho de sua equipe com mulheres pobres mostrou, por exemplo, que é difícil convencer uma mulher do risco de uma relação sem camisinha quando há outras ameaças de morte. "No morro do Borel, no Rio, a mulher está todo o tempo ameaçada de morte. Como vou dizer a ela que o homem com quem ela transa sem camisinha é um risco se, na verdade, é ele que a protege e traz a comida dos meninos", pergunta. Na pobreza -diz Nair-, você "negocia a melhor forma de sobrevivência". "A violência e os tiros aterrorizam mais que as mortes." Nos encontros que faz nos bairros, Nair diz que é comum mulheres relatarem que apanharam de seus maridos porque pediram para que usassem camisinha. "Muitas sabem que o companheiro sai com outras mulheres, mas ela precisa de sua proteção." Nas várias pesquisas com mulheres -a principal delas realizada por Naila Seabra Santos, da Secretaria da Saúde- constatou-se que a grande maioria delas sabe o que é Aids, como se pega e se evita. Por isso folhetos apenas não resolvem, diz Nair. Novas estratégias terão de se valer dos centros comunitários, postos de saúde, creches e escolas, onde as mulheres estão. O trabalho deve começar com o resgate da auto-estima. Com as mulheres de classe média, o trabalho é mais difícil. "Elas raramente aparecem nos debates e se sentem fora do raio de risco do HIV." O mais grave é que a epidemia está crescendo mais entre mulheres monogâmicas. Próximo Texto: Sobrevida faz ONG alterar mandato de diretores Índice |
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