São Paulo, domingo, 23 de março de 1997
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Para Pitta, BC agiu com fins eleitoreiros

ANTONIO CARLOS SEIDL
DA REPORTAGEM LOCAL

O prefeito Celso Pitta (PPB) disse que foi o Banco Central que vazou, com sentido eleitoreiro, a informação de supostas irregularidades na emissão de títulos da Prefeitura de São Paulo, visando prejudicar sua imagem a poucos dias da eleição municipal do ano passado.
A confirmação pública, disse Pitta, foi feita pelo próprio presidente do Banco Central, Gustavo Loyola, em entrevista concedida em Paris, na quinta-feira.
"Em entrevista no exterior, Gustavo Loyola declara textualmente que deixou vazar para a imprensa a informação, o que configura, em primeiro lugar, uma quebra de sigilo bancário e, em segundo, o uso do BC como braço político de campanha, o que estamos apontando e denunciando há muito tempo. Isso é um negócio inacreditável", afirmou.
Em entrevista exclusiva à Folha anteontem em seu gabinete, falando em tom de indignação e gesticulando muito, o normalmente sóbrio Pitta disse que a CPI dos Precatórios se transformou numa "central de notícias" para difamar a sua imagem.
"O esporte nacional hoje é bater no Pitta", disse. Ele negou que a prefeitura tenha emitido R$ 600 milhões em títulos para pagar dívidas judiciais posteriores a 1988. "Essa informação não é correta", protestou o prefeito.
Ele disse que enviou à CPI, anteontem, um ofício com demonstrações de todas as operações com precatórios e mais 16 caixas com documentos sobre todas as emissões, saldo e uso dos recursos.
Pitta não se considera abandonado por Paulo Maluf. "Se minha defesa dependesse de uma grande articulação política, sim, mas a defesa não depende disso, depende unicamente da oportunidade que seja dada a mim de esclarecer tudo na CPI", afirmou.
Dizendo-se vítima de um tratamento desleal, Pitta pediu que lhe digam: "Sr. Celso Pitta: pairam contra a sua pessoa as seguintes dúvidas. O que o sr. tem a dizer?". "Ótimo, é isso que eu quero".
A seguir, os principais trechos.
*
Folha - O sr. tem ligações com o Banco Vetor?
Celso Pitta - Não resta dúvida de que há uma campanha para me difamar. Por que preocupo tanto meus adversários? Devo estar representando um grande obstáculo, uma grande barreira às pretensões de outros, já que eu sou um quadro político novo, já que não tenho um histórico do tradicional político.
Folha - O sr. tem ambições políticas além da prefeitura?
Pitta - Como bom político, quero ser reconhecido pelo meu bom trabalho. Fora essa pretensão, as outras são extremamente secundárias. Meu propósito realmente era e é ser um bom prefeito da cidade de São Paulo.
Folha - Era ser um bom prefeito? Essa hesitação significa que o sr. acha que a sua permanência no cargo está ameaçada?
Pitta - Ao contrário. Falei era e é me referindo à situação anterior à CPI e à situação presente com a CPI, dizendo inclusive que essa situação não me intimida de forma alguma.
Folha - O que o sr. tem a dizer do ofício de 1995, apresentado pela CPI, no qual o sr. autoriza o Banco do Brasil a vender papéis para o Banco Vetor?
Pitta - É um documento padrão, absolutamente comum, nada tem de extraordinário.
O aparecimento desse documento é mais um desses fatos nos quais se tira do contexto uma carta, um ofício ou um documento e se coloca como sendo uma prova cabal da ligação do Pitta com o Banco Vetor.
Folha - O senador Bernardo Cabral continua insistindo que há indícios de seu relacionamento com o Banco Vetor?
Pitta - O que é lamentável nessa afirmação do senador é que ela é produto exatamente dessas situações pontuais que lhe são levadas. Esse caso da carta autorizando a operação é típico.
Não me é dada a chance de me pronunciar a não ser quando já sou condenado. A CPI, na realidade, virou uma grande central de notícias. Pelo que as manchetes indicam, o esporte nacional hoje é bater no Pitta.
Folha - O sr. não está tendo como se defender?
Pitta - Enviei ofício à CPI dia 19 de fevereiro me colocando à disposição dos senadores. Entendem que ainda não é o momento, mas ao mesmo tempo se deixam usar para referendar os vazamentos de situações que me colocam numa posição incômoda.
Folha - Como o sr. se sente como saco de pancadas com o ex-prefeito Paulo Maluf, seu mentor político, no exterior?
Pitta - Me sinto injustiçado, me sinto deslealmente atacado, me sinto desrepeitado, não só como cidadão ciente dos seus direitos, mas também como prefeito de uma cidade que depositou em mim toda sua confiança com a expressiva votação que tive.
Com relação ao ex-prefeito, ele não me abandonou, como quer fazer crer a imprensa repetidas vezes, porque ele está também ciente que eu não tenho nada a ver com essas falcatruas do mercado financeiro. Segundo, porque ele está no uso do seu sagrado direito de gozar férias depois de quatro anos de mandato trabalhando incansavelmente aqui na prefeitura.
Folha - O sr. diz que há uma intenção de difamá-lo. Quem o sr. acusa?
Pitta - Existe uma clara intenção política dos adversários de me difamarem.
Folha - Quem são eles?
Pitta - Muito claramente o senador José Serra, que tem o seu nome ligado à questão do Proer. Na realidade, quando se fala que os precatórios respondem por um desvio de R$ 600 milhões, o Proer responde por desvios da ordem de dezenas de bilhões de reais e nada foi esclarecido até o momento.
O outro é o senador Eduardo Suplicy, que, fora de questão, é o oponente clássico da administração tanto de Maluf quanto da nossa. Fora isso, nós temos aí o óbvio desejo e intenção dos senadores também de aparecerem.
Isso é compreensível por se tratar de política. O que não é compreensível é um tratamento desrespeitoso com relação à minha pessoa e, eu insisto, não só como cidadão, mas também como prefeito da maior cidade do país.
Folha - Como pode o esquema de Wagner Ramos ter funcionado nas suas barbas sem que o sr. tenha desconfiado?
Pitta - Foi exatamente por isso que o afastei e instaurei uma sindicância. Existe uma comissão de inquérito interno no âmbito da Secretaria de Negócios Jurídicos, que está conduzindo essas investigações. Segundo informações que me chegam, pessoas mais próximas ainda do sr. Wagner Ramos nunca notaram nenhum movimento suspeito.

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