São Paulo, domingo, 23 de março de 1997
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Fim da escola, início do aprendizado

LUÍS NASSIF

Alguns domingos atrás, na coluna "Abaixo a Escola", comentava-se aqui a inadequação da escola convencional para preparar alunos para a nova sociedade da informação que se avizinha --que exige criatividade, iniciativa, espírito crítico, capacidade para entender o novo.
A coluna se baseava em conceitos extraídos do livro "Didática, o Discurso Científico do Disciplinamento", da professora Ierecê Rego Beltrão.
A partir da coluna, Maria do Pilar Lacerda Almeida e Silva, professora de História da Prefeitura de Belo Horizonte, decidiu discutir o tema com alunos do segundo ano e, depois dos debates, cada qual escreveu comentário sobre como via a escola.
Uma breve seleção dos 80 trabalhos escritos sobre o tema pelos alunos:
1. "Caro Luís Nassif: li seu texto, e vi refletido nele as idéias de boa parte dos adolescentes. E acho que precisamos sim é de uma geração de alunos que saibam questionar e que acima de tudo buscassem mudanças. Não queremos que pensem por nós, não queremos receber informações e apenas dizer sim. Queremos o direito de discordar do sistema educacional existente e a liberdade de tentar torná-lo melhor. Queremos participar da criação da nossa educação. Lusia Jacqueline Araújo
2. "Caro Luís Nassif: moro em Belo Horizonte e estudo em um colégio que se enquadra em vários aspectos no modelo atual da escola brasileira a que você se referiu no artigo 'Abaixo a escola'. A começar pelo espaço físico: muros altos, pequenas janelas com grades e vários portões que atravessamos para entrar e sair da escola. O uniforme e a caderneta são indispensáveis para que entremos na escola. Nos primeiros dias de aula cada aluno recebe um bloco com normas a serem cumpridas dentro do colégio (algumas até ridículas e que nada têm a ver com o objetivo principal da escola: nos preparar para a vida contribuindo para a formação da nossa cidadania). Tudo isto se assemelha a uma prisão que de certa forma nos isola da vida fora do colégio, sem falar da grande burocracia para assistir as aulas. Certa vez cheguei 30 minutos atrasado no colégio porque moro longe e meu ônibus não passou. Tive que voltar para casa sem assistir a uma aula sequer, pois não aceitaram minha entrada. Há poucos dias, uma turma foi ameaçada de suspensão por cinco dias úteis por estar no corredor em horário de aula (estavam sem professor), e o que eles têm a dizer? A ordem tem de ser cumprida. As normas do colégio só são menos antiquadas do que a maneira com que as aulas são dadas. Todo dia vários professores despejam grande quantidade de matéria e conceitos antigos, que algumas vezes em nada se relacionam com o nosso dia-a-dia. E isto mesmo sabendo que depois de um ano não lembraremos de mais nada. E onde está o conhecimento adquirido? Os conceitos preenchem nossa memória (por pouco tempo) e as provas indicam nosso grau de aproveitamento, se estamos aptos ou não a avançar, passar de ano. Com isto, muitos se perdem nas dúvidas e acabam desestimulados, repetentes e mais tarde acabam largando as salas de aula, e outros, apenas pensando no vestibular, insistem em decorar velhos conceitos. Lucas Mourão Ribeiro
3. "Caro Luís Nassif: nós não somos latinhas de supermercado que são escolhidas a dedo e pelo rótulo. Onde fica a nossa cultura? Onde fica o nosso próprio conhecimento interior? Fica preso às carteiras e cadeiras que só podem ocupar 1 metro quadrado dentro de quatro paredes de concreto, dentro do tempo estabelecido de 50 minutos. O conhecimento verdadeiro, que permite às pessoas se tornarem críticas e pensantes, criativas e capazes de enfrentar o corre-corre do dia-a-dia, se obtém através de empenho, dedicação e diria até um pouco de 'audácia', tanto por parte dos alunos quanto dos professores e responsáveis. Um forte abraço, Alessandra de Freitas
4. "Prezado Luís Nassif: descobrir o país significa abrir espaço para a manifestação da potencialidade dos indivíduos, e principalmente uma análise no campo social. Não é criar um sistema educacional padronizado que, como diz o texto, forma alunos enquadrados, burocratizados, inábeis para romper desafios e enfrentar dificuldades. Sheyla de Campos Mendes
5. "Luís Nassif: como dizem, escola é lugar de aprender. Mas quem garante que somente o aluno tem que aprender, porque o aluno não pode ensinar o professor também; ensinar e aprender, esse deveria ser o lema de uma escola. Aí novamente surge a indignação. Mas, como diz a música de um pessoal da minha terra: 'A nossa indignação é uma mosca sem asas que não ultrapassa a janela de nossas casas'. Hosanna Batista
O efeito dessa coluna me provocou maior satisfação que toda a série sobre precatórios, por demonstrar o potencial de renovação presente em aspectos relevantes da vida nacional. Bem-vinda, professora Maria do Pilar e seus brasileirinhos, ao mundo dos "gauches" --dos que têm compromissos com as mudanças.

Email: lnassif@uol.com.br

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