São Paulo, sábado, 29 de março de 1997
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Sem-teto representa Paixão de Cristo

RICARDO FELTRIN; ANDRÉ LOZANO
DA REPORTAGEM LOCAL

Os moradores do casarão abandonado da alameda Nothmann, no centro de São Paulo, encenaram ontem uma adaptação da Paixão e Morte de Jesus Cristo. Em vez da cruz, o "Jesus" da peça é um sem-teto que foi condenado a morar em um imóvel abandonado.
A peça terá continuidade hoje e amanhã. Hoje, às 19h, o grupo vai encenar a visão da luz, no dia seguinte à morte de Cristo -interpretado pelo sonoplasta e gráfico Silvio da Silva, 23, morador do casarão e que durante sete anos foi fiel da Igreja Universal do Reino de Deus.
A peça foi acompanhada por cerca de cem pessoas. No casarão moram cerca de 200 famílias (quase mil pessoas).
Faixas de protesto contra a política dos governos municipal e estadual para os sem-teto foram pregadas em paredes do imóvel.
A peça foi organizada por religiosos das paróquias de Vila Brasilândia (zona norte) e Americanópolis (zona sul).
"É a primeira vez que é feita uma adaptação desse tipo. O objetivo é levar a palavra de Deus para a realidade que essas pessoas vivem", disse a irmã Maria Inês Volpato, freira há um ano.
"O que essas pessoas vivem não deixa de ser um calvário", disse o padre Selvino Baldissera, 41, do seminário Salvatoriano.
Moradores de rua
Também no centro, cerca de 300 moradores de rua participaram ontem da procissão da Sexta-Feira da Paixão.
A caminhada iniciou às 10h no largo São Bento e terminou às 12h20 na praça João Mendes, com a distribuição de lanches. Os fiéis encenaram quatro quadros da Paixão de Cristo.
Em cada um deles, os moradores de rua fizeram referência aos problemas que enfrentam hoje.
No largo São Bento, os fiéis encenaram o "Grande Julgamento" e fizeram alusão à "condenação atual dos pobres".
A segunda cena, "Jesus diante dos Poderosos", foi representada na praça Patriarca. Foi feita menção à exclusão social.
No largo São Francisco, representaram a "Tortura de Jesus" e se referiram à tortura ainda existente nas prisões brasileiras.
A quarta e última cena aconteceu na praça da Sé, nas escadarias da catedral. Foram lembrados os massacres.
"Quisemos aproximar a Paixão de Cristo à paixão do povo de rua. Caso contrário, a dor de Cristo fica muito abstrata", disse o padre Júlio Lancellotti.
(RICARDO FELTRIN e ANDRÉ LOZANO)

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