São Paulo, domingo, 30 de março de 1997
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Semanário lançou FHC

CÉLIA DE GOUVÊA FRANCO
DA REPORTAGEM LOCAL

"Os vira-casacas do desenvolvimentismo continuaram fiéis a um dos seus mitos: o de que sem capital estrangeiro não há desenvolvimento possível."
Pouco mais de 20 anos atrás, num dos seus artigos para o "Opinião", com o título "Os mitos da oposição", Fernando Henrique Cardoso analisou a mudança de posição nas décadas de 60 e 70 de parte da elite brasileira, que passou a adotar a defesa do nacionalismo e do desenvolvimento a partir de recursos internos e da empresa pública.
Foi nesse contexto que FHC comentou o "mito" de que sem capital estrangeiro não é possível haver desenvolvimento, afirmação que hoje soa irônica para um presidente cujo governo depende da entrada líquida de capital estrangeiros de US$ 26 bilhões.
Fora ocasionais comentários como esse, que destoam do seu atual ideário, FHC não precisaria pedir que fossem esquecidos seus artigos o jornal "Opinião", publicados entre 1972 e o início de 1977. Escrevendo basicamente sobre política, em especial sobre a redemocratização do país e sobre o modelo de Estado que o Brasil deveria ter, FHC se revela, nesses artigos, muito parecido com o FHC presidente da República.
"Fernando Henrique nunca foi um homem de esquerda radical, sempre foi um democrata radical", diz Raimundo Pereira, editor-chefe do jornal no seu início e que se encarregava de editar os textos de FHC.
Fernando Gasparian, dono do "Opinião", amigo de FHC e quem o convidou a escrever no jornal, acha que se as idéias políticas do presidente não mudaram, hoje ele se mostra muito menos nacionalista do que antes, como demonstra sua disposição de privatizar a Vale do Rio Doce, por exemplo.
O que ninguém discute é a importância do "Opinião" como "trampolim" político de FHC. Ele mesmo reconhece que o jornal foi sua primeira tribuna política, como contou a um grupo de jornalistas em Washington, quando esteve nos EUA no ano passado.
Sociólogo e professor respeitado, FHC era no início dos anos 70 conhecido apenas no meio acadêmico. Escrevendo no "Opinião", passou a ser muito mais conhecido fora da universidade e convidado a escrever para outras publicações.
FHC também exerceu outro papel, informal, na rotina do "Opinião", lembra o jornalista Antonio Carlos Ferreira. "Ele já demonstrava naquela época o que sabe fazer melhor -negociar. Sempre que surgia uma divergência entre o Fernando Gasparian (o dono do jornal) e os jornalistas ou com colaboradores, era Fernando Henrique quem fazia a ponte."
Ferreira também se lembra bem que os primeiros textos de FHC não primavam exatamente pela elegância estilística.
"Nós, jornalistas, aconselhávamos os intelectuais a escreverem de forma mais simples, mais acessível. O Fernando Henrique, algumas vezes, tomou esse conselho muito ao pé da letra e tentava ser popular usando expressões como é aí que a porca torce o rabo'. Os primeiros textos dele acabaram sendo aprimorados na redação e acho que isso ajudou o Fernando Henrique a escrever melhor".
(CGF)

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