São Paulo, domingo, 30 de março de 1997
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Investir no social, tarefa só do Estado?

CLÁUDIO AMAURY DELL'ACQUA

Há anos o Brasil necessita de uma eficaz política de desenvolvimento urbano, que possa atenuar de imediato o problema do déficit habitacional crescente.
A parcela da sociedade que habita em áreas adequadamente urbanizadas e com relativa qualidade de vida encara a situação em que vivem os moradores de favelas e cortiços com preconceito e medo, deixando apenas para o governo a resolução desse problema social.
O aumento do déficit habitacional -calculado hoje em 5 milhões de unidades- teve suas raízes na longa crise econômica do país, no esgotamento do modelo de financiamento adotado até meados dos 80, nas estratosféricas taxas de inflação, que ajudaram a destruir os mecanismos de financiamento, além dos sucessivos erros nos modelos econômicos adotados. Jamais tivemos uma política habitacional contínua.
Inúmeros estudos e relatos confirmam que é preciso mudar alguns conceitos urbanos teóricos para que se possa enfrentar o problema da submoradia, da favela, da ocupação indevida de áreas públicas e, o mais grave, da inadequada ocupação das áreas de proteção aos mananciais.
As contradições entre as legislações estadual e municipal na área de proteção ambiental dos mananciais, dificultando a existência de loteamentos e moradias legalmente regulares para atender à demanda imobiliária local, em vez de resolver os problemas apenas ajuda a agravá-los. Há nessas regiões forte atrativo, com a abundância de áreas "livres" para ocupações desordenadas e desestruturadas.
É preciso rever, com critérios que realmente protejam o meio ambiente, a elitista lei de parcelamento do solo, que impede maior flexibilização no uso dos terrenos posicionados em áreas protegidas.
Exemplo da ineficácia da atual legislação é o crescimento, em número assustador, de loteamentos clandestinos, nos quais as construções têm baixa qualidade e, portanto, curta durabilidade, mas que obrigam os governos a executarem obras de infra-estrutura.
O desenvolvimento do Brasil é inexorável. Mas, se não houver agilidade e bom senso dos legisladores, a qualidade de vida da maioria da população será ainda pior. A infra-estrutura existente tenderá ao colapso, como já ocorre com a saúde, por exemplo.
Os governos, isoladamente, não conseguirão dar conta desse problema. Os esforços que a Prefeitura de São Paulo, com o projeto Cingapura, e o governo do Estado de São Paulo, por meio dos conjuntos habitacionais da CDHU, vêm fazendo são dignos de elogios, mas insuficientes.
É indispensável a cooperação da iniciativa privada, atuando de forma empresarial para atender à demanda por habitação popular.
As soluções técnicas existem e estão disponíveis, com possibilidade de construir moradias até 30% mais baratas que as produzidas pelos sistema convencionais.
Para começar a resolver essa situação, os investimentos na área social deverão ir muito além das boas intenções. O primeiro passo para o ser humano sentir-se digno é ter sua moradia em condições adequadas de vida.

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