São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 1997
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Seguros, a leitura do índice combinado

ANTONIO PENTEADO MENDONÇA

Não faz muito tempo, num artigo nesta Folha, eu escrevi que os números do mercado segurador brasileiro em 1996 não tinham sido tão bons quanto em 94 e 95. A explicação para isto é a guerra de preços nos seguros de automóveis, que os reduziu para patamares até 30% mais baixos do que nos anos anteriores, sem que nenhuma outra carteira tenha conseguido suprir essa queda de faturamento.
Naquela ocasião, eu expliquei as diferenças entre os tipos de resultados de uma seguradora e terminei mostrando que boa parte das companhias em operação no país haviam se valido dos resultados patrimoniais para mascarar o seu mau desempenho ao longo do ano.
Uma companhia de seguros apresenta quatro tipos de resultados diferentes: o resultado industrial, que é o resultado apenas da operação de seguros; o resultado operacional, que é o resultado da soma do resultado das operações de seguros com o resultado da aplicação financeira dos prêmios; o resultado patrimonial, que é o resultado da aplicação do capital e das reservas da companhia; e o resultado final, que é o lucro ou o prejuízo consequente do seu funcionamento no período.
No Brasil, está na moda falar em índice combinado das seguradoras. O índice combinado não é mais do que uma fórmula para medir o resultado industrial da companhia. Partindo da premissa de que o faturamento da seguradora é equivalente a 100 pontos, o índice combinado soma os sinistros, as despesas administrativas e as despesas comerciais e compara o resultado com os 100 pontos equivalentes ao faturamento.
Se a seguradora tem um índice combinado abaixo de 100, ela está ganhando dinheiro com a gestão direta do seu negócio, quer dizer, o seu resultado industrial está positivo. Todavia, afirmar que todas as vezes que este resultado estiver acima de 100 a empresa está tendo prejuízo nem sempre é verdadeiro.
Partindo de um exemplo simples, que me foi dado pelo presidente de uma grande companhia de seguros, fica fácil entender como elas podem ganhar dinheiro com a operação de seguro, mesmo tendo um índice combinado acima de 100 pontos.
A caderneta de poupança, sem acrescentar os custos administrativos e comerciais, tem um índice combinado de 106 e nem por isso as instituições gestoras têm prejuízo com o negócio. Muito pelo contrário, a poupança é altamente rentável, e não há banco que não busque desenvolver o produto, mesmo tendo de saída um índice combinado acima de 100 pontos.
Ao garantir uma rentabilidade real de 6% ao ano, a caderneta de poupança está fazendo com que os 100 pontos, depois de aplicados durante um ano, retornem para o investidor como 106, quer dizer, o banco tem um índice combinado negativo e, todavia, não é verdade que esteja perdendo dinheiro com a operação.
No caso das seguradoras, a mesma premissa também vale, com a diferença que o índice combinado da maioria das companhias de seguros em operação no Brasil, incluídas as despesas comerciais e administrativas, que não estão computadas no exemplo da caderneta de poupança, estão abaixo de 108 pontos.
Como eu expliquei acima, além do resultado industrial, as seguradoras têm o resultado operacional, que é a soma do resultado da operação direta de seguros com o resultado das aplicações financeiras dos prêmios auferidos.
Assim, da mesma forma que o gestor da caderneta de poupança ganha dinheiro aplicando os recursos da caderneta em investimentos que rendam mais do que os 6% que ele precisa pagar como remuneração ao investidor, as seguradoras ganham dinheiro aplicando os prêmios dos seus seguros em investimentos capazes de suprir a eventual margem negativa da operação direta de seus seguros.
Como a maior carteira do mercado brasileiro é a de seguros de automóveis, que é uma carteira de sinistralidade alta e de margens muito apertadas, dificilmente as companhias com grande peso de produção deste produto conseguem um índice combinado abaixo de 100.
Mas, dada a entrada do dinheiro da carteira de automóveis ser rápida e significar valores expressivos, as companhias conseguem aplicá-lo com taxas de remuneração bastante interessantes, que compensam com folga o prejuízo direto da operação do seguro.
Vale dizer: mesmo tendo um índice combinado negativo, elas estão ganhando dinheiro para os seus acionistas e ganhando dinheiro com o negócio de seguros, já que os seus resultados são a soma do resultado da atividade direta de gerenciar as apólices com o resultado das aplicações financeiras do dinheiro captado com a venda das mesmas.
É por isso que a simples análise do índice combinado duma seguradora é insuficiente para mostrar a sua real situação. O índice combinado é um referencial importante, mas que só tem valor se analisado dentro dum contexto maior.

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