São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 1997
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Eles sabem o quanto o rock é pesado

THALES DE MENEZES
DA REPORTAGEM LOCAL

O trabalho é duro, carregando muito peso, às vezes até alta madrugada. Mas tem gente que sonha com essa dureza que é a vida de roadie, o cara contratado para, entre outras coisas, cuidar dos instrumentos das bandas roqueiras.
Antes do surgimento do rock, todo músico, mesmo se fosse uma estrela do jazz ou da música pop, cuidava de seu instrumento. Como o rock difundiu o uso de baterias com muitas peças e amplificadores cada vez mais possantes e maiores, o peso do equipamento foi aumentando e as bandas foram contratando gente para carregar a tralha.
Hoje, astros como U2 e Rolling Stones têm um batalhão de gente para o trabalho pesado de transporte, mas cada músico mantém um roadie de confiança para seus instrumentos, um escudeiro que toma conta das "armas".
No Brasil, onde a estrutura dos shows é muito menor, mesmo as bandas de primeira linha contam apenas com roadies mais íntimos. O Barão Vermelho, por exemplo, fez shows em São Paulo este mês trazendo seus três roadies.
Um deles é Domingos Manoel Olympio, 30, que cuida da cozinha da banda, o baterista Guto Goffi e o percussionista Peninha. "No show, eu fico ligado o tempo todo neles, nem posso olhar para as garotas. O Peninha tem mania de usar uma coisa e depois jogar para o alto. Eu fico ali, dando uma de goleiro, catando tudo", conta.
Mas o trabalho começa antes do show. Tirar as coisas do caminhão, montar tudo no palco. Depois, vem a parte boa: fazer a primeira passagem para regular o som, tocando os instrumentos.
Até 1986, Domingos era caseiro, mas ficou desempregado. Então arrumou vaga em um estúdio. Um dia, o Barão foi ensaiar lá, o grupo gostou do jeito e do trabalho dele e, semanas depois, veio o convite.
Domingos diz que não sabe tocar, "só bato um pouco, não sou rico para ter bateria e aprender. Se tivesse, poderia ser bom."
Falando em dinheiro, é difícil saber quanto os roadies ganham no Brasil. Muitas vezes existe o esquema de "brodagem". Todo grupo começa com a ajuda de amigos ou parentes na função. Os Paralamas e o os Titãs ainda mantém irmãos dos integrantes como roadies.
Quem é roadie contratado só ganha quando rola show. Em média, no caso de uma banda famosa, de R$ 50 a R$ 200 por noite. Domingos, que é exclusivo do Barão, recebe adiantamentos quando o grupo está parado. "Eles sempre me ajudam", diz.
Há histórias de roadies que ficaram ricos. Domingos teve um colega que hoje é dono de uma frota de caminhões. Humberto Ramos, 37, foi roadie de Raul Seixas e Erasmo Carlos e hoje tem uma promotora de shows.
Vander de Lima, 28, foi roadie do RPM e atualmente trabalha para quatro bandas de trios elétricos. Diz que que já comprou um carro, um Escort 94, e uma casa, "coisa a maioria da turma da minha idade não consegue fazer".
Ele revela que o roadie tem de estar preparado para tudo. "No RPM, quase não tinha contato com a banda, era apenas assistente de luz, mas uma vez precisei dar uma de segurança e empurrar fãs que tentavam agarrar os caras."
Todos eles concordam que o melhor é poder viajar. Vander lembra que o Sepultura levou roadie para morar nos EUA. Humberto fala de um primo que já foi a mais de 20 países com vários músicos.
Outra unanimidade é o sucesso dos roadies com as garotas. "Eu sou feio pra caramba, mas elas querem ser minhas amigas para chegarem mais perto dos caras da banda. E eu aproveito", revela Domingos, satisfeito.

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