São Paulo, segunda-feira, 31 de março de 1997
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Tatiana foi o maior papel de Célia Helena

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Célia Helena tornou-se atriz ainda "menina", como lembram colegas, aos 16, na versão cinematográfica do TBC, a Cia. Vera Cruz, de Franco Zampari.
Deixou, como registro desta sua adolescência, o filme "Floradas na Serra". Fazia "Turquinha", papel pequeno, namorada do personagem de Rubens de Falco.
Cresceu no palco ao lado da maior das estrelas do TBC, Cacilda Becker, com quem excursionou, no elenco da atriz, e por quem, segundo relatos, guardava um sentimento ambíguo, de amor e ódio. Era como Cacilda, em explosão emocional interior.
No teatro, sua primeira peça de maior marca foi "Boca de Ouro", de Nelson Rodrigues, direção de Ziembinski, com Ronaldo Daniel, hoje o diretor Ron Daniels.
Célia Helena fazia na peça a "grã-fina" que se apaixona, que se deixa levar por Caveirinha, personagem de Daniels. Foi ele quem a levou para o Oficina, onde fariam história no teatro.
Esteve em quase todas as peças, desde "José do Parto à Sepultura" até pouco antes de "Rei da Vela", quando deixou a companhia.
Nos ensaios, ela se entregava e deixava os demais atônitos. Uma vez, contam, fazia um laboratório, o estudo de uma cena, com um ator que não estava rendendo. Deu um grito, "que caia o teto!", e bateu na mesa. A mesa partiu ao meio.
Em "Andorra", em outro laboratório, os atores que agrediam uma jovem perderam o controle. Ela entrou no meio, empurrou os agressores contra a parede, pegou um fuzil de cena e o quebrou, na própria perna.
Célia Helena era "bonita, muito bonita", conta o ator Renato Borghi, "morena, os olhos escuros, magra, sensual".
O seu principal papel, talvez aquele por que vai ser lembrada, foi Tatiana, de "Pequenos Burgueses". É a filha da família, que sofre de descrença completa, de tédio diante da existência.
Dizia coisas como "eu sei que isso aqui sou eu, que aquilo é uma cadeira, e mais nada". Apaixonava-se por Nil, personagem de Daniels. "Ela se aproximava com uma ternura quase impossível de rejeitar", lembra ele, emocionado, "mas Nil rejeitava".
Esteve também em "Os Inimigos", "Quatro num Quarto", num aprendizado crescente que foi o de toda a geração, como recorda o crítico Sábato Magaldi.
Deixou a companhia para reunir-se ao diretor argentino Victor Garcia, com o qual fez "O Balcão", outra montagem histórica do teatro nos anos 60, na produção de Ruth Escobar.
No mesmo espetáculo estava Raul Cortez, o ator com quem Célia Helena havia tido uma filha, a também atriz Lígia Cortez (leia texto ao lado).
Aos poucos, foi diminuindo a presença no palco, em favor do papel de professora. Criou o Teatro-Escola Célia Helena, dos mais respeitados. Levou o teatro à periferia, como formação. Foi pioneira nas peças para escolas. Fez novelas, desde Tupy e Excelsior, depois na Globo, em "Brilhante", "Direito de Amar".
Mas ainda estaria em espetáculos marcantes no teatro, como "Boca de Cena", de José Vicente. Ganhou prêmios, o Molière. Mais recentemente, esteve na remontagem de "Pequenos Burgueses".
Também em "Laços Eternos", peça espiritualista que marcou a afirmação do gênero. Ela era espiritualista e, segundo os amigos, foi à religião que canalizou muito da paixão que tinha no palco.

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