São Paulo, sexta-feira, 4 de abril de 1997
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Moradores denunciam invasão de PMs

DA SUCURSAL DO RIO

Moradores da favela Dona Marta, em Botafogo (zona sul do Rio), estão deixando avisos nas portas de suas casas com informações sobre seu horário e local de trabalho.
Segundo eles, os avisos destinam-se a evitar que as portas de barracos sejam arrombadas durante as batidas que a Polícia Militar realiza no morro.
Moradores ouvidos ontem pela Folha, que não se identificam por medo de represálias, disseram que é melhor "autorizar" a entrada dos policiais que ter a porta de casa destruída. Alguns deixam a chave da porta com os vizinhos.
A Folha ouviu ontem depoimentos de moradores denunciando que os policiais do posto comunitário local espancam e extorquem as pessoas que, durante a noite, passam pelo cruzamento das duas principais ruas da favela, especialmente os compradores de drogas.
A Secretaria da Segurança está averiguando as denúncias (leia ao lado). "Eu trabalho de segunda a sábado, das 8h às 19h30, e no fim-de-semana. Às vezes vou para a casa de meus parentes. Obrigada!!!", diz o bilhete deixado pela moradora E.M.F. em sua porta, arrombada e trocada há dois meses.
A garota M.X.F., 10, sobrinha da dona da casa, disse que a tia costuma deixar os bilhetes desde que a porta foi arrombada por policiais. "A polícia vem muito aqui, às vezes duas vezes no mesmo dia."
Dominado pelo tráfico, o Dona Marta é um dos morros mais violentos do Rio. No ano passado, foi cenário de um videoclipe do cantor Michael Jackson. À época, o então líder do tráfico local, Marcinho VP, deu uma entrevista criticando a ação policial.
Marcinho foi preso, mas conseguiu escapar e está foragido. As vielas e pontos estratégicos do morro são guardados por sentinelas e olheiros do tráfico armados com fuzis AR-15. Cocaína e maconha são vendidas à luz do dia.
A viúva Ana, 78, teve a porta de casa coberta de inscrições pelos moradores, para evitar que seu barraco seja revistado. S., 32, líder comunitária, afirma que muitas vezes sabe que a polícia entrou em sua casa, mas nada pode fazer.
Quando os policiais sobem o morro em operações de busca, segundo S., até os alto-falantes da associação, normalmente usados para transmitir recados de utilidade pública, têm que ser desligados.
Até hoje há em algumas portas círculos vermelhos que, segundo os moradores, foram pintados no ano passado por policiais, para marcar as casas já revistadas.
A Casa da Cidadania, organização não-governamental instalada no morro, vai entrar com ação de indenização contra o Estado em nome de José Rodrigues da Silva, ferido durante uma operação policial no morro há dois meses.
O irmão de Silva, Roberto Rodrigues, disse que o irmão não é ligado ao tráfico local.

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