São Paulo, domingo, 6 de abril de 1997
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Rotina da violência causa fobia coletiva

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

Transformada em rotina, a violência provoca estresse, ansiedade e mesmo depressão, gerando fobias coletivas.
Pesquisadores americanos acompanham desde a década passada os efeitos psicológicos da violência. Um desses estudos, iniciado em 1992, foi realizado com 3.700 estudantes, em seis escolas.
"Quanto maior a frequência da violência, maior o trauma", afirma Mark Singer, psicólogo responsável pelo acompanhamento, publicado ano passado pela Associação Médica Americana.
Psicólogos constataram tendência a traumas mentais, revelados num comportamento ansioso ou deprimido, desvios que não recebem qualquer tratamento, prejudicando o desempenho profissional ou emocional.
Textos produzidos pelo Centro de Prevenção à Violência da Universidade de Columbia mostram como as pessoas introjetam a agressividade nas ruas e passam a agir como se estivessem exatamente numa guerra.
Diadema
O episódio de Diadema, envolvendo abusos cometidos por policiais, serviu para exteriorizar, através da indignação, a tensão e frustração de São Paulo com a insegurança. A discussão sobre se o crime está caindo ou subindo é, neste momento, estéril.
Uma polícia que já não é eficiente, como a brasileira, torna-se ainda mais assustadora com as cenas de Diadema, revelando despreparo, crueldade e impunidade.
Para completar, a população é informada da suspeita de que as cenas só vieram à tona graças a gangues de traficantes, que viram no Jornal Nacional um espaço mais confiável do que delegacias.
A cidade é cenário diário de um enorme circo de delinquências e agressões, inoculando o medo não apenas nas vítimas, mas em amigos, familiares e testemunhas.
Numa pesquisa do DataFolha, 45% disseram ter sido assaltados; muitos deles mais de duas vezes. Isso significa que rigorosamente todos os habitantes foram direta ou indiretamente atingidos, ligados por uma corrente de insegurança e desconfiança na polícia.
Os números mostram que podem não existir motivos para pânico; as taxas de assassinato em alguns bairros -Moema, por exemplo- são comparáveis às das regiões mais seguras de Nova York.
Estímulos à insegurança
Não faltam, porém, estímulos reais à insegurança. Na região da Grande São Paulo, uma pessoa é morta por hora. O fator de difusão de insegurança não está, essencialmente, aí. Apenas uma ínfima minoria da população é assassinada.
Por dia, são 303 vítimas de furto; 240 roubos (furto com arma). Ladrões levam por hora 13 veículos. São, portanto, milhares de pessoas que contam para dezenas de pessoas todos os dias algum tipo de agressão que sofreram. É uma gigantesca antipropaganda boca-a-boca.
Ao final do ano, os milhares são milhões de vítimas, contando para os milhões de amigos, familiares ou colegas de trabalho. Agrega-se à cota de lembrança de crimes do passado. É, assim, um assunto permanente de toda a cidade, destruindo a imagem da polícia, reforçando o pânico e, muitas vezes, a histeria.
É algo semelhante a acidente de avião, estatisticamente o mais seguro e confiável meio de transporte. Dá mais medo à maioria das pessoas do que pegar ônibus ou viajar de carro.
Levantamento do DataFolha informa que 61% dos paulistanos têm medo de ser atingidos por uma bala perdida -o que estatisticamente é remoto. "Ninguém mais sabe o que é real ou histeria", afirma Oscar Vieira, que dirige o Ilanud, entidade da ONU para prevenção da violência.

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