São Paulo, terça-feira, 8 de abril de 1997
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Tempo de repensar

ANDRÉ LARA RESENDE

Era de se esperar que a combinação da abertura comercial com a valorização do câmbio implicasse uma significativa redução do superávit comercial. Assistimos, entretanto, a uma deterioração muito mais rápida do que se poderia imaginar.
A rápida reversão das contas de comércio exterior foi inicialmente associada ao forte surto de demanda que se seguiu à estabilização.
O estancamento da inflação crônica proporciona à população, em especial à de baixa renda, um significativo aumento de poder aquisitivo. Some-se a volta do crédito ao consumidor, um aumento generalizado de confiança, e o resultado é conhecido: um surto de demanda que transborda num expressivo aumento das importações.
A experiência mostra que é preciso reagir com rigor a essa inevitável explosão de demanda, sob risco de comprometer o esforço de estabilização. A forma correta de fazê-lo é por meio de um profundo ajuste fiscal. Contida a excessiva pressão dos gastos públicos, abre-se espaço para o crescimento da demanda privada.
Mas não há, infelizmente, milagres. O ajuste das contas públicas é sempre um longo e penoso processo. E ficamos muito aquém do esperado. O jeito foi promover um rigoroso aperto da política monetária. O surto de demanda foi revertido -não sem custos, é preciso reconhecer-, mas a deterioração do balanço comercial não foi estancada. Enquanto as importações continuam a crescer, as exportações estão praticamente estagnadas.
Após um período de rápido crescimento, associado ao efeito de liberação de uma demanda reprimida, esperava-se que as importações viessem a convergir para um novo patamar.
Não há, entretanto, até agora, sinal dessa convergência. Ao contrário, o coeficiente de penetração continua a crescer. Supondo um crescimento econômico apenas razoável e valores plausíveis para as contas de serviços e transferências, a projeção das contas externas nos leva a déficits em conta corrente perto de 5% do PIB para os próximos anos.
Desastre iminente? Claro que não, mas essa situação só é sustentável na hipótese de financiamento externo abundante e da rápida recuperação do crescimento das exportações. Essa parece ser a aposta implícita na atual política de gradual redução dos juros internos e de minidesvalorizações aproximadamente equivalentes à inflação doméstica.
A abundância de financiamento externo não é algo com que se deva contar. Todo financiamento só é abundante enquanto não é imprescindível. Mais preocupante, contudo, são as implicações para a política comercial. No lugar de um programa coerente, pautado pela meta da unificação de tarifas e a integração regional, que cria condições estáveis e previsíveis, a política de comércio exterior corre o risco de ser definida por um intervencionismo casual e um protecionismo sem rumo.
O efeito perverso sobre os investimentos, as distorções e as ineficiências na alocação de recursos irão, sem dúvida, comprometer a capacidade de recuperação das exportações.
Na tentativa de estimulá-las, os programas de promoção e subsídios implicarão custos fiscais crescentes. Não existem respostas fáceis, mas não é preciso ir longe para concluir que é tempo de repensar.

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