São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997 |
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O reacionarismo moderno de Greenberg
PAULO VENANCIO FILHO
Greenberg (1909-1994) chega junto com sua crítica. O que tem suas vantagens. Afinal, suas posições críticas se definiram há mais de 40 anos, no contexto particular da cultura americana da época, e se cristalizaram na defesa eloquente e intransigente do expressionismo abstrato. Faz algum tempo elas têm sido revistas, quando não enfaticamente criticadas e até mesmo ostensivamente negadas. No mundo multiculturalista e pós-moderno as idéias estéticas de Greenberg se tornaram politicamente incorretas. Porém, mesmo antes disso, lá pelo final dos anos 50 e início dos 60, com o declínio do expressionismo abstrato e o surgimento da pop, o dogmatismo de Greenberg tinha se tornado incapaz de acompanhar as transformações artísticas. A arte tinha se deslocado da inflexível trajetória que o crítico lhe havia traçado desde o Renascimento, e, então, a sua arrogância esclarecida e emancipadora se transformou num rancor retrógrado. Da pop e da minimal art nada tinha a dizer a não ser condenar. Greenberg se tornou um reacionário moderno -o que pode parecer um paradoxo, mas do qual encontramos vários exemplos. Um "trotskista eliotiano", assim foi definido pelo crítico e historiador da arte T.J. Clark. Com a modernidade nunca transigiu. Com a sua visão de modernidade, melhor dizendo. Esta, nas artes plásticas, culminava no cubismo, na sua asserção do plano e na afirmação dos meios da pintura. Nesse percurso a pintura se livrava de qualquer referência exterior na direção de uma "pureza" que só dissesse respeito a ela mesma. O cubismo era o cânon greenbergiano. Com o surgimento da pop, a referência exterior se torna de alguma forma presente e, no entanto, desde os mosaicos bizantinos a planaridade não tinha sido tão afirmada como em um pintor como Jasper Johns. E, ainda assim, Greenberg prefere Jim Dine e Robert Indiana a Jasper Johns. O critério do crítico começava então a vacilar, senão a se contradizer. Pois, como é possível ter afirmado a grandeza artística de Jackson Pollock e mais tarde, em 1993, na entrevista a Ann Hindry publicada neste livro, revelar que gosta de uma mediocridade inqualificável como Andrew Wyeth? Na sua perspectiva Duchamp necessariamente deve ser desqualificado como a "primeira investida frontal contra o 'formalismo' surgida no seio da vanguarda" e "ela se firmou imediatamente como rebaixamento de aspirações". Ou ainda: "Não posso deixar de pensar que foi por frustração que Duchamp se tornou tão 'revolucionário' a partir de 1912; e que foi por ter perdido a esperança de ser novo e avançado em sua própria arte que ele se passou a se colocar contra a arte formal em geral". Pobre Duchamp, que não sabia que "frustração" se tornaria critério e que seria condenado por ousar desviar da norma formalista. Quando os critérios chegam a esse rebaixamento, o silêncio seria bem-vindo. Os textos que comentam a obra greenbergiana, de críticos conhecidos como Harold Rosenberg, Yve-Alain Bois, Rosalind Krauss e Leo Steinberg, entre outros, colocam em debate aspectos relevantes do pensamento do autor. Há posições pró e contra. O grande historiador da arte Erwin Panofsky colocou limites à iconologia, disse que ela não se aplicava à arte moderna. O "formalismo" de Greenberg -ele achava a palavra vulgar- nada tinha de vulgar, foi dos mais inteligentes. Seu erro, porém, foi não lhe ter colocado limites. Texto Anterior: O poeta da sedição Próximo Texto: CRONOLOGIA Índice |
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