São Paulo, domingo, 20 de abril de 1997
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Saber ou não saber?

POR CHRISTOPHER JOYCE

CHRISTOPHER JOYCE
DA NEW SCIENTIST

A professora do departamento de neurologia e psiquiatria do centro médico da Columbia University, em Nova York, Nancy Wexler, tem em sua família um histórico do mal de Huntington, doença que degenera o cérebro.
A probabilidade de Wexler carregar o gene que causa essa doença fatal é de 50%. Já existe um teste confiável para detectar tal gene, mas Wexler preferiu não fazê-lo. "Se eu soubesse hoje que carrego tal gene e deixasse cair um copo d'água, o que poderia acontecer a qualquer hora, teria de lutar com o pensamento de que talvez esse acidente fosse o primeiro sintoma da doença", diz.
Wexler dirige nos EUA um painel que discute a ética em pesquisas sobre o genoma humano. Hoje, para cada dólar norte-americano que se gasta para o mapeamento do genoma, uma parte vai para estudos sobre a ética envolvida no uso dessa informação.
Em 1989, várias empresas de biotecnologia competiam nos EUA para introduzir um teste que identificasse indivíduos que carregassem o gene responsável pela fibrose cística. Com a probabilidade de haver 12 milhões de pessoas com o gene, o mercado para esse teste poderia atingir centenas de milhões de dólares ao ano.
Na época, a Sociedade Norte-Americana de Genética Humana (ASHG) apresentou algumas questões sobre o fato: toda a população deveria ser testada? qual o valor da informação se não existir nenhum tratamento? que procedimentos se deve seguir para aconselhar os indivíduos -ou mulheres grávidas- que carregam tal "gene defeituoso"?
Lee Hood, diretor da Divisão de Biologia do California Institute of Technology, é um dos pioneiros no mapeamento de genomas e acredita que "a sociedade deve estabelecer maneiras de manter confidencial certas informações, que só pertencem aos médicos e aos indivíduos, não a empresas".
Paul Billings, do New England Deaconess Hospital, de Boston, já tem compilado diversos casos de discriminação genética. Um emprego foi negado a um homem que possuía o gene da doença de Gaucher, que causa lesões nos ossos e na pele e pode aparecer até os 80 anos, apesar de ele ser perfeitamente saudável.
Uma seguradora negou seguro a um indivíduo que apresentava o gene da hemocromatose hereditária, doença que causa cirrose no fígado, diabetes, hiperpigmentação na pele e parada cardíaca. A doença só se manifesta na idade entre 4 e 19 anos e, quando pediu o seguro, ele já havia recebido tratamento e estava curado.
O risco que se corre é de se criar um novo "status" na sociedade: os indivíduos saudáveis-doentes. Essas pessoas podem ser saudáveis, mas terão de carregar o estigma que as classifica como deficientes em relação aos outros.

Tradução Izabela Moi

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