São Paulo, sexta-feira, 25 de abril de 1997
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Aula prática

JANIO DE FREITAS

A ausência de medidas para reprimir o consumo, entre as que o Conselho Monetário Nacional formalizou na reunião de ontem, decorreu da conveniência, estabelecida há dias, de não adotar providências que agravariam, por sua má repercussão no empresariado e na opinião pública, o desgaste já sofrido pelo governo ultimamente.
Foram motivos políticos, portanto, que prevaleceram sobre os da política econômica como concebida pelo governo. O que não chega a frustrar as previsões do chamado aperto, de tão frequente presença no noticiário e nos comentários econômicos. Mas contém a novidade de que o governo deixou de se sentir, mesmo que temporariamente, com a força que lhe permitia lançar medidas à sua exclusiva vontade.
As circunstâncias formadas por opinião pública e seus reflexos políticos chegam, enfim, ao conhecimento do governo.
Os homens do ditador
Os governos dos Estados Unidos e da Inglaterra e o ditatorial Fujimori ocupam espaços amplos do noticiário para negar a participação de ingleses e americanos no desfecho do impasse em Lima. É claro que a participação estrangeira não seria confirmada por quem a praticou ou a recebeu. Não seria necessária, porém, para reduzir a simples mentira diplomática a negativa tríplice.
Foi para o Peru e lá permaneceu uma "comissão de especialistas" americanos, a título de dar instrução na luta contra os guerrilheiros peruanos. Disso sabe qualquer peruano medianamente informado. E Fujimori nem correu o risco de negar a presença daqueles americanos.
Como o comprovam os jornais de logo após a invasão da embaixada pelos guerrilheiros, os ingleses não fizeram segredo do envio de pessoal do seu grupo de "especialistas" para ajudar Fujimori. Conhecido sob a sigla SAS, o grupo é considerado de ferocidade só igualada, em todo o mundo, pelo seu similar israelense. Nas operações que realiza, se sobrar algum adversário vivo, é porque houve erro inadmissível na ação do SAS.
A derrota sem farsa
As lideranças governistas, sobretudo sua principal figura, o pefelista Inocêncio Oliveira, estão acusando o presidente da Câmara de responsabilidade pelas derrotas do governo, anteontem, na votação de itens da suposta reforma administrativa contrários ao funcionalismo e aposentados. Michel Temer não teria esperado o número de presenças conveniente ao governo.
Duvidar do governismo a toda prova do deputado Michel Temer, depois das demonstrações menos apreciáveis que já deu, é uma injustiça. E, no caso, uma farsa a mais: se os próprios líderes reconheceram a presença de pelo menos 390 deputados da bancada governista, bastando ao governo 308 votos para sair vencedor, é claro que contra ele votaram muitos dos seus.
E se a causa fosse a malandragem insuficiente de Michel Temer, os líderes da bancada governista não precisariam adiar para data ainda incerta, depois de suspender às pressas os trabalhos de anteontem, as votações restantes do mesmo projeto mal denominado de reforma.
A derrota, simplesmente, está na ordem atual das coisas para o governo.
Palavras próprias
Engraçado o argumento de Fernando Henrique Cardoso, no Canadá, pondo seu projeto de reeleger-se como consequência da demora na aprovação, pelo Congresso, das suas propostas de reformas. São incontáveis as entrevistas em que os líderes do governo reconheceram a paralisação dos projetos de reformas, o que durou todo o ano passado e mais alguma coisa, porque a prioridade governista era aprovar a emenda da reeleição.
"As respostas têm sido muito lentas", ao que Fernando Henrique juntou a imediata identificação da causa: e não por interesses partidários, "mas por pequenos interesses pessoais". Está aí, dito pela pessoa mais autorizada a falar desses interessantes dominantes.

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