São Paulo, quarta-feira, 14 de maio de 1997
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Michael Jackson assume a dor em novo CD

PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REDAÇÃO

Demorou, mas bateu. A luta que Michael Jackson tem travado contra as notícias negativas que o circundam aparece em dimensão acentuada na coletânea disfarçada "Blood on the Dance Floor - HIStory in the Mix", álbum que chega agora às lojas de todo o planeta.
Se ano a ano o redemoinho de pressão pública sobre sua vida pessoal tem aumentado, até agora Michael tentava cantar as tormentas com moderação. Mas as (poucas) inéditas do CD invertem a lógica: estão imersas num caldo de sangue (a faixa-título), dor ("Morphine"), assombrações ("Ghosts"), sustos ("Is It Scary").
O substrato é, como sempre, o funk -o artista perdido se repetindo, dirão as bocas grandes. Nas letras, quem se choca com as acusações de perversidade sexual que o sobrevoam encontrará elementos de sobra a condená-lo.
Jackson retoma -partindo de "HIStory"- uma personagem que já começa a se tornar recorrente em suas canções: Susie. Citada no CD anterior como garotinha assassinada, volta de passagem em "Superfly Sister" e como protagonista de "Blood on the Dance Floor" -adulta e assassinada.
Não pense naquela boneca ancestral de Barbie. Ou melhor, pense. Susie -boneca branca e virtuosa- é como Michael parece querer ver a si mesmo, garota que escapa do mundo dançando.
Adiante, em "Morphine", assume a dor que o pressiona e grita por morfina -droga, mais perversão. "Confie em mim", canta, dirigindo-se à multidão que ele adora e que o faz sofrer de fofocas.
"Não vou converter você", avisa em seguida -não afirma que resiste em ser convertido à normalidade, mas sim que não tentará converter os fãs à sua anormalidade. Não abrirá mão dela, que afinal cultiva com orgulho.
Aí é que está. A pestilência que ele exala é o que produz sua arte. O cristianismo preferirá vê-lo queimando em pecado a apenas ouvir seus funks. No novo CD, há cinco, para quem quiser ouvir.
Infelizmente, é só isso. "Blood on the Dance Floor" converte-se em sórdida arapuca de mercado da sexta faixa em diante. Rolam oito remixes -por nomes como David Morales e Fugees- que destoam da obra funky do artista e existem para que ele atraia mais atenção e tire mais uns níqueis.
Faixas como "Stranger in Moscow", "History" ou "Scream" estiveram todas em estado de graça no CD anterior. Não servem para nada remixadas. Até soam datadas -as batidas industriais das novas "Morphine" e "Ghosts" são bem mais contemporâneas que versões "ordinary dance".
Mas assim é Michael. Cada vez mais pálido e retocado de plástica, parecido a um feto, impõe mais uma vez sua figura estranha ao mundo. Se houver sido tranquilo o tempo de hoje, não, mas se houver sido conturbado, não será de um político messiânico ou alguma Tereza de Calcutá a cara deste fim de século. Terá a cara pop de Michael Jackson. Salve-se quem puder.

Disco: Blood on the Dance Floor
Artista: Michael Jackson
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 18, em média

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