São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 1997
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O PSDB ficou com a conta da caixinha do PFL

ELIO GASPARI

O PFL conseguiu dois milagres. Primeiro, seus deputados ficaram com o dinheiro da caixinha da reeleição, e o PSDB ficou com a crise. Depois, o venerando partido passou a bloquear a formação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito e deixou ao PSDB a tarefa de humilhar seus deputados forçando-os a retirar as assinaturas do requerimento que pode abrir o caminho para a investigação. Caso inédito: o dinheiro saiu das mãos de um pefelê (o governador Amazonino Mendes), foi para os bolsos de outros dois (Ronivon Santiago e João Maia), e é o PSDB que está a se explicar.
Em termos figurados, isso acontece porque os tucanos, como todos os pássaros, voam quando há barulho. Em termos reais, os dois milagres foram produzidos pela capacidade que o PFL tem de assustar o governo.
É o PFL quem precisa evitar a CPI, pelo simples e bom motivo de que são seus os dois deputados confessadamente corruptos, e, pelo que disseram, é seu também o governador corruptor. São do PFL os grampeados e os grampeadores. (Narciso Mendes, o suposto "Sr. X", foi deputado federal pelo PFL. Sua mulher, Célia Mendes, ainda o é.) São do PFL três deputados acusados pelo companheiro X. Se isso fosse pouco, sai do PFL o principal foco de pre$$ão para a derrubada do superintendente da Zona Franca de Manaus.
O presidente Fernando Henrique Cardoso ainda não colocou suas impressões digitais na manobra contra a CPI. Tenta evitá-la, mas usa luvas. Há informações de que essa situação o está deixando desconfortável, e, por isso, não se deve descartar a possibilidade de ele vir a lavar as mãos, liberando a bancada tucana.
Se a CPI não puder ser formada, a responsabilidade irá para o PSDB. Quanta água dessa bacia haverá de manchar os sapatos de camurça de FFHH, não se sabe, mas é certo que limpos não sairão. Já o PFL ficará puro como bata de inocente. Expulsou os deputados, o que não quer dizer nada. (Mesmo assim, quer dizer que até agora não pensou em expulsar o governador Amazonino Mendes.) Se conseguir cassar-lhes os mandatos, mostrará sua capacidade purificadora. Quanto à CPI, sempre poderá dizer que, se o Planalto a tivesse desejado, ele a teria facilitado.
Ao lado desses dois milagres, deu-se também uma astuciosa satanização do ministro Sérgio Motta. As gravações não o incriminam da mesma forma que apontam para o governador do Amazonas, mas também não o absolvem como gostaria e, de forma prepotente, propala.
Sérgio Motta joga bruto, sabe colocar adversários do governo de joelhos, como também sabe afagá-los quando os domestica. É pena que faça as duas coisas valendo-se dos instrumentos de políticas públicas sob sua jurisdição no Ministério das Comunicações. Há nele a mistura de truculência e exibicionismo típicos das personalidades que vivem em Brasília momentos de sonho que se acabam na quarta-feira. Mandam muito no Carnaval, mandam nada depois. São pessoas incapazes de entender um fenômeno como o do vice-presidente Marco Maciel, um pefelê que manda um pouquinho há quase 30 anos.
As características pessoais e administrativas do ministro não deveriam transformá-lo em bode expiatório de traficâncias alheias. Os dois deputados se referiram a uma caixinha federal, supostamente sob o controle do ministro. Uma CPI seria bom expediente para a caçada a esse baú de piratas. Por enquanto, o que se sabe é que ele se rebelou contra a degola do superintendente da $uframa. Como essa era uma exigência do governador Amazonino Mendes (do PFL, nunca é demais repetir), a conta não fecha. Uma pessoa não pode estar ao mesmo tempo distribuindo favores e impedindo que os favorecidos os recebam.
É fantástico que o PFL esteja conseguindo preservar o governador do Amazonas, enquanto os tucanos não conseguem se solidarizar com Motta. Vão às suas festas quando anuncia lorotas, como os telefones a R$ 300, mas voam quando ele é envolvido numa traficância intrapefelê.
Os tucanos da geração de FFHH tiveram dois lindos sonhos. Um, vencido, foi a doce paixão pela atriz norte-americana Jean Seberg ("Acossado", de Jean-Luc Godard, fácil de achar na prateleira de velharias das boas lojas de vídeo). O outro, vigente, é o dia em que suas novas idéias velhas empolgarão o país, transformando aquilo que é o PFL do Ronivon num partido parecido com os discursos dos pefelês no circuito financeiro de São Paulo, onde não tem votos, mas tem admirações. O PFL, ex-PDS, ex-Arena, como uma grande jibóia, adora apóstolos espertos.

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