São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 1997
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Cinema brasileiro busca imagens fora do eixo Rio-SP

JOSÉ GERALDO COUTO
ESPECIAL PARA A FOLHA

O cinema brasileiro está descobrindo que existe vida fora do eixo Rio-São Paulo. Pelo menos dez novos longas-metragens foram filmados longe das grandes metrópoles (veja quadro).
"É hora de sair do umbigo e mergulhar no país, ver que histórias estão para ser contadas", resume o carioca Luiz Carlos Lacerda, que dirige "For All" em parceria com Buza Ferraz.
O Nordeste é a região mais filmada (nada menos que sete dos dez títulos), mas há também produções realizadas no interior de Minas Gerais e São Paulo, no pampa gaúcho e na fronteira do Mato Grosso do Sul com o Paraguai.
Remake
Nem todos os cineastas são das regiões em que se ambientam seus filmes. O paulistano Anibal Massaini Neto, por exemplo, foi ao sertão de Pernambuco filmar "O Cangaceiro", remake do clássico de Lima Barreto (rodado, curiosamente, em Vargem Grande do Sul, interior de São Paulo).
A catarinense Tania Lamarca, por sua vez, foi às regiões agropecuárias de Barretos (SP) e Uberaba (MG) para mostrar um interior próspero e modernizado, com seus rodeios e suas caminhonetes importadas.
Apesar da diversidade de temas, gêneros e estilos, duas vertentes predominam.
Uma é o filme de cangaço: além de "O Cangaceiro", há "Corisco e Dadá", de Rosemberg Cariry, e o premiado "Baile Perfumado", de Lirio Ferreira e Paulo Caldas.
12 mil figurantes
A outra corrente dominante é a dos temas históricos: "A Guerra de Canudos", de Sérgio Rezende, "For All" e "Anahy de las Misiones", de Sérgio Silva.
Por conta da reconstituição de época e da utilização de batalhões de figurantes ("Canudos" usou 12 mil), esses são os filmes mais caros. Custaram, respectivamente, R$ 6 milhões, R$ 5 milhões e R$ 2,5 milhões.
"A Guerra de Canudos" está pronto e deve estrear em 5 de setembro. Os outros dois estão em fase de finalização.
"For All" tem um tema promissor: as reviravoltas ocorridas na vida da cidade de Natal (RN) quando os norte-americanos construíram lá uma base militar, em 1943.
"Anahy" inspira-se numa antiga lenda dos pampas -de uma mulher que vendia despojos de soldados mortos na Guerra Cisplatina-, mas transfere a ação para a época da Revolução Farroupilha (1835-45).
Paisagem interior
Mas não é só a busca de temas e paisagens regionais que tem levado alguns cineastas a se afastar do eixo Rio-São Paulo.
O paulista Beto Brant, por exemplo, resolveu ambientar "Os Matadores" na fronteira com o Paraguai "como uma metáfora da situação-limite que os personagens vivem, eticamente".
Mas Brant reconhece a importância de mostrar imagens inéditas. "O espectador, quando entra no cinema, quer fazer uma viagem de duas horas por lugares e situações que não costuma ver."
O paralelo entre a paisagem geográfica e a paisagem interior dos personagens também foi buscado pelo cearense José Araújo em "O Sertão das Memórias".
Realizado em preto-e-branco com R$ 350 mil, o filme vem conquistando prêmios em festivais como o de Berlim e o Sundance Film Festival, em Utah (EUA), por sua abordagem visceral do universo do sertão.
Araújo utilizou seus próprios pais como protagonistas e os habitantes de Miraíma (CE) como coadjuvantes desse mergulho no imaginário profundo do sertanejo, numa mistura de mitologia e crítica social.
Thomas Mann
Experiência ainda mais radical foi a do casal Bia Lessa/Danny Roland. Eles gravaram em vídeo os workshops em que pessoas comuns do interior do Ceará encenavam o romance "O Eleito", de Thomas Mann.
Ao editar o material, os diretores resolveram transformá-lo num longa de ficção.
Incluindo a transposição para película de cinema, o filme custou R$ 150 mil, ou 40 vezes menos que "A Guerra de Canudos".

LEIA MAIS sobre filmes produzidos fora do eixo Rio-SP à pág. 4-12

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