São Paulo, domingo, 15 de junho de 1997
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A tramóia de volta

JANIO DE FREITAS

A citação de um trabalho meu e de certas circunstâncias que o envolveram, feita à comissão que investiga as acusações de Paulo de Tarso Venceslau a dirigentes petistas, torna necessária uma intervenção na divergência entre o depoente, Gilberto Carvalho, e o acusador.
Ex-secretário da Executiva Nacional do PT, Carvalho disse que Venceslau defendeu o contrato para construção do metrô de superfície em Campinas, onde era secretário de Finanças quando publiquei, com antecedência comprovada, a vitória da empreiteira Mendes Jr. na respectiva licitação. Venceslau, ouvido pela Folha sobre as palavras de Carvalho, negou a defesa e disse que "o contrato teria sido assinado depois que saiu da prefeitura".
A concorrência fraudulenta foi montada em conjunto pela administração Jacó Bittar em Campinas, pelo governo Quércia e pela empreiteira. A essência da negociata era toda financeira, envolvendo repasses estaduais, convênios, dívidas e obrigações monetárias, tornando indispensável a participação da Secretaria das Finanças do município nos detalhamentos do acerto geral. O responsável pela secretaria na época era Paulo de Tarso Venceslau.
Quem se opôs à negociata foi só o vice-prefeito, rompendo com Jacó Bittar quando revelada e comprovada a fraude. Quércia foi à Justiça contra mim, sendo derrotado em duas instâncias por meus defensores, advogados Manuel Alceu Affonso Ferreira e José Rubem de Campos. Luiz Inácio da Silva, embora sem me citar, atribuiu a revelação a propósitos de "prejudicar eleitoralmente o PT". Jacó Bittar, pouco depois, abandonou o PT e trocou Luiz Inácio por Quércia.
Adeptos do esbanjamento
A convocação extraordinária do Congresso em julho, já encaminhada entre Fernando Henrique Cardoso e o deputado Luís Eduardo Magalhães, ilustra com fidelidade o que é, de fato, o empenho do governo e dos seus congressistas em moralizar os gastos públicos e eliminar desperdícios para conter o tão acusado déficit público.
O gasto dos cofres públicos com os vencimentos de senadores e deputados, em convocação extraordinária, é triplicado: cada um deles passa a receber, em vez de R$ 8 mil, R$ 24 mil. Sem qualquer trabalhinho a mais (ou seria melhor dizer, apenas, qualquer trabalhinho?). A semana da quase totalidade dos congressistas continuará tendo só três dias úteis. Três, no máximo -de terça a quinta. Ao começo e ao fim desse sacrifício, o desgaste com os almoços intermináveis e os papos de gabinete continua compensado por passagens aéreas pagas, sim, mas não pelos parlamentares.
A necessidade da convocação extraordinária, pressupondo falta de tempo para votações no período normal, pode ser medida pelo uso que o Congresso tem feito do tempo, por orientação sempre combinada entre Fernando Henrique e os líderes governistas na Câmara e no Senado.
Na segunda metade de maio, por exemplo, o PFL e o PSDB estabeleceram um "recesso branco" de 15 dias, meio mês que, na execução, foi até mais do que isso. Vadiagem destinada apenas, e assim explicada pública e desabridamente pelos líderes governistas na Câmara, a esvaziar o escândalo da compra de votos para a reeleição e engavetar o pedido de CPI (a Presidência e os líderes do PFL e do PSDB fizeram por Fernando Henrique e Sérgio Motta o que não foi feito por Fernando Collor e PC Farias).
Na semana passada, os dias úteis nem incluíram a quinta-feira. Os 350 deputados presentes na Câmara foram dispensados já na manhã daquele dia, por iniciativa dos governistas que preferiram adiar a votação da Lei Geral das Telecomunicações para a quarta-feira que vem (em vez de votação, aliás, o projeto do Ministério da Comunicações e o relatório do deputado Alberto Goldman mereciam era investigação, a começar dos negócios que estão opondo, em vai-e-vem no texto, os milhões de dólares dos empreendimentos em sistema "trunking" ou em celular convencional).
A convocação extraordinária, que compete ao presidente da República, e o respectivo custo, que compete aos nossos bolsos, serão tão indecentes quanto as férias de meio de ano concedidas ao Congresso.

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