São Paulo, domingo, 15 de junho de 1997
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Mulheres também "fogem" de casa

ALEXANDRA OZORIO DE ALMEIDA

"Quanto mais fico fora de casa, melhor estou. É terrível dizer isso, mas é assim que me sinto." Surpreendentemente, essa frase é de uma mulher, Linda Avery, 38, supervisora de uma fábrica nos EUA, e não de um homem.
Uma pesquisa feita pela socióloga Arlie Hochschild, da Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA) mostra que mulheres também estão buscando no trabalho uma fuga para as pressões do lar.
"Vou trabalhar mais cedo para sair logo de casa. Lá, nós conversamos e brincamos. Quando chego em casa, todos querem atenção. O bebê, que deveria estar dormindo há horas, está acordado, e há uma pilha de louça suja na pia", explica Linda, uma das entrevistadas por Arlie.
A socióloga fez um estudo por três anos com 130 funcionários de uma empresa, e concluiu que o trabalho vem se tornando uma espécie de "casa", e vice-versa.
Políticas incentivadas pelas empresas como flexibilização de horário, qualidade total e incentivo moral e financeiro, características dos anos 90, fazem com que as pessoas se sintam mais eficientes no trabalho, onde os problemas seriam mais fáceis de resolver.
Já os relacionamentos familiares são mais complicados de lidar, há muita demanda emocional, principalmente dos filhos, e os casamentos são difíceis de manter. Resultado: as pessoas preferem "relaxar" no trabalho, postergando a chegada em casa.
No livro "The Time Bind: When Work Becomes Home and Home Becomes Work", em que publica sua pesquisa, Arlie também discute o conceito de "quality time", segundo o qual não é preciso passar muito tempo com os filhos, mas "aproveitar" o pouco tempo disponível com as crianças.
Para Arlie, isso é "downsizing emocional": as pessoas negam ter necessidades emocionais relacionadas à família. "Há uma transferência do 'culto da eficiência' do trabalho para casa. O 'quality time' torna-se algo como uma reunião de trabalho", afirma.
A consequência seria que as famílias viraram prisioneiras dessa "amarra de tempo", e as crianças norte-americanas estão tendo mais problemas com drogas, indisciplina e desmotivação devido à falta de apoio familiar.

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